sábado, 15 de maio de 2010

Peregrinação a Portugal abre nova etapa deste pontificado

O pontificado de Bento XVI ficará dividido entre o antes e o depois de sua peregrinação apostólica a Portugal. Esta é conclusão a que se chega ao conversar com os especialistas em informação religiosa ou ler seus artigos - sejam eles favoráveis ou contrários ao pensamento de Joseph Ratzinger.

Na celebração das Vésperas, todos puderam constatar que o Papa empreendia sua 15ª viagem apostólica internacional (de 11 a 14 de maio) em circunstâncias particularmente desfavoráveis, por conta da crise que assola a Igreja após as revelações de abusos sexuais cometidos contra menores por sacerdotes.

Fortaleza inesperada

Alguns dos veículos de comunicação que lançaram os mais duros ataques contra o Papa se deram conta de que, já no primeiro dia de sua visita, algo estava mudando radicalmente. O New York Times, em 11 de maio, publicava na internet uma crônica de Rachel Donadio na qual considerava que as palavras do Bispo de Roma dirigidas aos jornalistas tratando do assunto "foram as mais duras" que ele pronunciou sobre esta matéria.

"Os ataques ao Papa e à Igreja não provêm apenas de fora, uma vez que os sofrimentos a Igreja padece agora vêm precisamente de dentro da Igreja, do pecado que existe no interior da Igreja", constatava o Pontífice. A crônica citava as últimas medidas do Papa para purificar a Igreja.

"Este é um claro exemplo das mudanças de tom que o Papa está imprimindo ao Vaticano", comenta John L. Allen Jr., vaticanista do jornal norte-americano National Catholic Reporter.

Miguel Mora, correspondente no Vaticano do jornal espanhol "El País", um dos jornais europeus mais condescendentes com o papado, escreveu uma análise na qual apresentava o Santo Padre com o título de "O gladiador solitário".

"Quando os escândalos da ocultação dos casos de pedofilia clerical deram origem à maior crise da Igreja das últimas décadas, Ratzinger deu o melhor de si mesmo", escreveu, reconhecendo nele "a coragem e a ferocidade de um gladiador solitário, incompatíveis com um homem de 83 anos" na "purificação de uma Igreja pecadora".

Carinho transformado em números

A mudança na atitude dos jornalistas foi reforçada pelos números surpreendentes da visita papal. O Pontífice reuniu, na esplanada do Santuário de Fátima, em 13 de maio, uma multidão de mais de meio milhão de pessoas - 100 mil a mais que na visita de João Paulo II em 2000, quando este beatificou Jacinta e Francisco.

Em Lisboa, o Papa reuniu cerca de 200 mil pessoas para a Missa, e, no Porto, cerca de 120 mil. Contando todas as pessoas que estavam presentes nas ruas nos três locais visitados, provavelmente chega-se a um milhão de pessoas - num país de 10 milhões de pessoas, 10% de seus habitantes encontrara-se com o Pontífice.

Um Bento XVI até então desconhecido

Desta vez, os veículos de comunicação não viram a habitual timidez do Papa; pelo contrário, puderam conhecer seu lado mais íntimo, especialmente quando o viram ajoelhar-se, em 12 de maio, diante de Nossa Senhora, na Capelinha das Aparições de Fátima.

O redator de informação religiosa do Le Figaro, Jean-Marie Guénois, que esteve a poucos metros de Bento XVI neste momento, imortalizou estes minutos em que o Pontífice ofertou uma Rosa de Ouro à Virgem.

"Inclinou-se, como que transformado, no momento em que seu assistente lhe trouxe o famoso presente, para que o colocasse aos pés da imagem. Naqueles instantes, já não era um Papa, mas uma criança. Aproximou-se com o sorriso de um menino no dia das mães", escreveu.

"Ao seu redor, cerca de 300 mil pessoas vibravam com ele", lembra o cronista. O momento foi interrompido quando o mestre de cerimônias o tomou delicadamente pelo braço: "E o menino voltou a ser Papa".

Octávio Carmo, da agência católica de notícias portuguesa Ecclesia, presente no voo papal de regresso à Roma nesta tarde de sexta-feira, também escolheu este momento como síntese desta peregrinação: "Esta foi, talvez, a viajem que melhor define o pontificado de Bento XVI: um homem que surpreende as multidões que não o conhecem, mas que se revela especialmente em privado".

A missão de Fátima não terminou

Andrea Tornielli, vaticanista do jornal italiano Il Giornale, destacou as palavras da homilia de 13 de maio, quando o Papa explicava que "iludir-se-ia quem pensasse que a missão profética de Fátima está concluída", considerando que a mensagem da Virgem não se limita ao atentado contra João Paulo II, de 1981.

O próprio Bento XVI reconheceu, durante a coletiva de imprensa concedida a bordo do avião, que o texto do terceiro segredo de Fátima se refere "à necessidade de uma paixão da Igreja, que naturalmente se reflete na pessoa do Papa".

Na quinta-feira, em seu encontro com os bispos portugueses, Joseph Ratzinger falou assim de sua missão à luz de Fátima: "Como vedes, o Papa precisa de abrir-se cada vez mais ao mistério da cruz, abraçando-a como única esperança e derradeiro caminho para ganhar e reunir no Crucificado todos os seus irmãos e irmãs em humanidade".

Tendo demonstrado emoções tão profundas, uma nova etapa do pontificado de Bento XVI se inicia - ao menos para os profissionais de informação religiosa.


Fonte: Zenit.

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