quarta-feira, 21 de julho de 2010

Continua diálogo com anglicanos apesar dos obstáculos

A Igreja da Inglaterra decidiu, no dia 12 de julho, depois de uma votação apertada, que as mulheres podem ser consagradas como bispos, como já ocorre em outras Igrejas anglicanas.
Ainda que a decisão deva ser referendada dentro de um ano por outro Sínodo similar, trata-se de uma vitória que marca um ponto de inflexão importante dentro da história da Igreja da Inglaterra. O Sínodo rejeitou as "soluções" conciliadoras entre ambas tendências propostas pelos arcebispos de Canterbury e York, Rowan Williams e John Sentamu.
Esta decisão levanta obstáculos ulteriores ao diálogo ecumênico, como reconheceu Dom Brian Farrell, secretário do Conselho Pontifício para a Unidade dos Cristãos nesta entrevista concedida à ZENIT.
Outra consequência, que Dom Farrell matiza prudentemente, poderia ser a aproximação à Igreja católica de alguns grupos contrários à ordenação de mulheres, como já ocorreu nos estados Unidos e na Austrália.
De fato, o reverendo David Houlding, importante membro do Grupo Católico do Sínodo, afirmou, como informa ICN, que os chamados "tradicionalistas" estão ficando "sem opções", e que logo deverão tomar "decisões duras" sobre seu futuro.
"Eu fico na Igreja da Inglaterra até o momento em que me expulsem. Não sairei voluntariamente, irei se for obrigado. Quanto mais isso procede da maneira atual, maior é a sensação de que a porta está se fechando", afirmava Houlding.
Dom Farrell afirma que é difícil prever movimentos nesse sentido, já que todos os "tradicionalistas" são próximos da Igreja católica. Em todo caso, reiterou, a Santa Sé "seguirá adiante" com o diálogo ecumênico.
ZENIT: O Sínodo anglicano de York aprovou a ordenação de mulheres bispo, decisão que está se impondo paulatinamente em toda a Comunhão Anglicana, contra o parecer das comunidades chamadas tradicionalistas. Esta decisão pode ser considerada firme, ainda que a votação definitiva será somente em 2012. Pode haver alguma mudança ou essa decisão é definitiva?
Dom Brian Farrell: o Sínodo que acaba de ser celebrado em York é o Sínodo da Igreja da Inglaterra e não possui autoridade fora daquele país, nem sequer no País de Gales ou na Escócia. A Comunhão Anglicana está composta por 38 províncias independentes, das quais a Inglaterra é uma. Várias províncias já têm bispos mulheres. Tratava-se no Sínodo de introduzir a legislação que permita isso na Inglaterra e certamente o processo continuará, porque a maioria quer isso.
ZENIT: Uma das grandes "derrotas" deste Sínodo foi a da solução de compromisso proposta pelos arcebispos de Canterbury e de York. Muitos analistas, depois da votação, acreditaram que a comunhão entre anglicanos estava rompida. É assim?
Dom Brian Farrell: A situação é muito complexa e até paradoxal. Se se tivesse aceitado o compromisso, se estaria diante de uma situação na que, por exemplo, uma paróquia ou um grupo poderia rejeitar a autoridade de seu bispo diocesano mulher e colocar-se sob a autoridade de outro bispo homem. Assim, essa paróquia não estaria em comunhão com as outras paróquias da mesma diocese. De certa forma isso seria m cisma estrutural, ainda que não se chame assim..
Agora, neste momento, esse modo de proceder não é possível, e a paróquia tem somente a opção de ficar em comunhão com seu próprio bispo ou sair da Igreja da Inglaterra. Falando com precisão, isso ocasionaria a perda de membros, mas não um cisma dentro da igreja da Inglaterra.
ZENIT: O Vaticano, em encontros anteriores, tinha advertido que a decisão de consagrar bispos mulheres comprometia o diálogo ecumênico com a Igreja católica. Qual é a situação atual do diálogo, depois da decisão do Sínodo?
Dom Brian Farrell: Todas as Igrejas do primeiro milênio, católica, orientais e ortodoxas afirmaram que somente homens podem ser ordenados. Essas Igrejas vêem a ordenação da mulher como um abandono ilegítimo da Tradição autêntica.
Pelo que se refere ao diálogo ecumênico, como se disse anteriormente, algumas províncias anglicanas possuem há algum tempo mulheres bispos e o diálogo continuou.
Naturalmente, o diálogo deve tratar dessa situação e reconhecer que se criou um obstáculo enorme para a consecução da finalidade do diálogo em si, que seria a comunhão eclesial total e visível. O diálogo católico-anglicano continuará dentro destes parâmetros.
ZENIT: Várias informações manifestam a possibilidade de que grupos tradicionalistas se acolham Anglicanorum Coetibus e entrem em comunhão com a Igreja Católica. Inclusive existem informações sobre um grupo de sacerdotes anglicanos que já teria se colocado em contato com um bispo católico. É previsível um movimento nesse sentido?
Dom Brian Farrell: O que será a realização concreta do previsto na Anglicanorum Coetibus ainda está por ver-se. Qualquer pessoa que professe a fé católica e não tenha impedimentos pode pedir para entrar na comunhão católica. Anglicanos ou ex-anglicanos podem entrar nesta comunhão através da jurisdição que permite a preservação de alguns elementos da tradição anglicana. Como podem também pedir, simplesmente, ser recebidos na paróquia católica local.
Um particular problema de discernimento apresenta-se quando se trata de grupos. Não todos os grupos têm a mesma "consistência eclesial". Definitivamente corresponde à Conferência Episcopal de um país ou região estudar bem o que se pode e se deve fazer. Não posso prever se serão muitos ou poucos.
O que é conveniente relembrar é que os que alguns chamam "anglicanos tradicionais" costumam ser da parte evangélica da Comunhão Anglicana e, portanto, afastados da Igreja católica por suas convicções eclesiológicas.
ZENIT: Por último, com que sentimento recebe a Santa Sé e, em particular, o dicastério para a Unidade dos Cristãos, a decisão do Sínodo de York?
Dom Brian Farrell: Não há que exagerar-se o efeito. Lamentamos que a Comunhão Anglicana tenha deixado neste ponto o que consideramos a Tradição essencial da Igreja desde a origem. Mas o processo começou há bastante tempo. Continuaremos o diálogo ecumênico com o realismo que acolhe a realidade como é e tem a consciência de que o cominho por diante será longo e árduo. Sabendo, entretanto, que o diálogo é uma tarefa imposta pelo próprio Cristo e sustentada pela graça do Espírito Santo, alma da Igreja de Cristo.

Fonte: Zenit.

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