quarta-feira, 28 de abril de 2010

Os mandamentos do meio ambiente

Nos cinco anos desde que foi eleito Papa, Bento XVI tem falado repetidas vezes sobre temas relacionados com a ecologia. Como consequência, alguns começaram a chamá-lo de “Papa Verde”, mas esse rótulo não faz justiça às suas declarações.
Um guia útil para o que o atual pontífice disse sobre a criação e nossa responsabilidade para com ela é recolhido em um livro publicado no ano passado pelo jornalista Woodeene Koenig-Bricker. Em Ten Commandments for the Environment: Pope Benedict XVI Speaks Out for Creation and Justice (Dez Mandamentos para o Meio Ambiente: O Papa Bento XVI fala sobre a Criação e Justiça) (Ave Maria Press), recolhe os comentários do Papa intercalados com suas opiniões pessoais sobre o meio ambiente.
A frase “Dez Mandamentos para o Meio Ambiente” não é de Bento XVI, mas foi o nome de um discurso proferido em 2005 por Dom Giampaolo Crepaldi, secretário do Conselho Pontifício Justiça e Paz (atualmente Dom Giampolo Crepaldi é bispo de Triesta, Itália).
A mensagem principal desses mandamentos é que devemos ser administradores responsáveis da criação de Deus, e isso corresponde com o que o pontífice afirmou posteriormente, comentava Koenig-Bricker.
“Hoje todos vemos que o homem poderia destruir o fundamento de sua existência, sua terra”, dizia o Papa em 24 de julho, respondendo às perguntas dos sacerdotes das dioceses italianas de Belluno-Feltre e Treviso.
Esse cuidado com a criação baseia-se em uma convicção que vai muito além de uma simples preocupação pela ecologia. Bento XVI desejava isso claramente ao responder uma pergunta durante suas férias de verão do ano seguinte. Em seu encontro com o clero da diocese de Bolzano-Bressanone, no dia 6 de agosto de 2008, indicava que há um “vínculo inseparável” entre criação e redenção.
Subjugar a terra
"O Redentor é o Criador, e se nós não anunciamos Deus em toda sua grandeza, como Criador e Redentor, tiramos também o valor da Redenção”, afirmava o Santo Padre após mencionar que, infelizmente, nas últimas décadas a doutrina de criação quase desapareceu da teologia.
Bento XVI observava que acusaram os cristãos de ser responsáveis da destruição da criação pelas palavras do Gênesis, “subjugar a terra”.
Essa acusação é falsa, afirmava, posto que vemos a terra como criação de Deus: “a terefa de ‘subjugá-la’ nunca foi entendida como uma ordem de fazê-la escrava, mas sim como a terefa de custódia da criação e de desenvolver seus dons, de colaborarmos ativamente na obra de Deus, na evolução que ele pôs no mundo, de forma que os dons da criação sejam valorizados e não pisoteados e destruídos”.
A esse contexto entre o natural e o sobrenatural, entre fé em Deus e respeito pela criação, foi algo sobre o que Bento XVI se voltou na entrevista concedida aos jornalistas na viagem de avião para Sydney, Austrália, em 12 de julho de 2008.
“Necessitamos do dom da Terra, da água; necessitamos do Criador. O Criador se faz presente em sua criação. Dessa forma compreendemos que não podemos ser realmente felizes, não podemos promover a verdadeira justiça em todo mundo sem um critério em nossas ideias, sem um Deus que seja justo e nos dê a luz da vida”, dizia.
O Papa mencionava o papel do Redentor em sua homilia da Missa do Galo de 2007. Cristo, afirmava, “veio para devolver à criação, ao cosmos, sua beleza e sua dignidade: é isto que tem início no Natal e faz os anjos saltarem de alegria”.
O Natal é a festa de criação restaurada, a Terra se renova e celebra que céu e terra, homem e Deus se unem, comentava.
Dom de Deus
Pouco depois da publicação do livro Koenig-Bricker, veio a encíclica do Papa “Caridade na Verdade”. Na encíclica foram dedicados ao meio ambiente alguns parágrafos. Entre outros pontos, o pontífice advertia contra uma visão de uma natureza puramente materialista. A salvação humana não pode vir da natureza por si só, afirmou.
Temos uma legítima administração sobre a natureza, afirmava Bento XVI, que implica o dever de entregar às futuras gerações uma terra em boas condições.
Isso não é só uma questão de ciência ou economia, explica, mas sim uma questão que precisa integrar uma ecologia humana que inclui tudo o que forma nossa existência.
“O livro da natureza é uno e indivisível, tanto no que diz respeito à vida, sexualidade, matrimônio, família, relações sociais, em suma, o desenvolvimento humano integral”, disse o Papa.
Há uma antinomia fundamental em nossa mentalidade se, por um lado, insistimos no respeito pelo meio ambiente natural enquanto, por outro lado, não respeitamos o direito à vida e à morte natural, insistia Bento XVI.
A relação entre o respeito pelo meio ambiente e o respeito pela vida foi um tema recorrente nas declarações do Papa sobre ecologia.
“Os grandes temas morais, vitais, da paz, a não-violência, a justiça e o respeito da criação não conferem por si só a dignidade ao homem”, dizia ao novo embaixador da Irlanda junto à Santa Sé em 15 de setembro de 2007.
A vida humana tem uma dignidade natural, explicava. “É preocupante o fato de que frequentemente os mesmos grupos sociais e políticos que, admiravelmente, estão mais em harmonia com a maravilha da criação de Deus dão pouca atenção para a maravilha da vida no útero”, comentava o Papa.
Ecologia e Paz
No início desse ano, em sua Mensagem para o Dia Mundial da Paz de 2007, Bento XVI também uniu o respeito pela ecologia e paz.
“Assim, pois, além da ecologia e natureza há uma ecologia que podemos chamar ‘humana’, e que por sua vez requer uma ‘ecologia’ social’”, observava. A experiência demonstra que toda atitude irresponsável com o meio ambiente resulta em danos da convivência humana, e vice-versa”, acrescenta.
“Cada vez mais é possível ver claramente um nexo inseparável entre paz com a criação e a paz entre os homens. Ambas pressupõem a paz com Deus”, concluía o Papa.
Essa relação entre ecologia e paz voltou como tema central da Mensagem para o Dia Mundial da Paz de 2010.
O meio ambiente é um dom de Deus a todos os povos, dizia. Nem a natureza e nem os seres humanos podem ser vistos como meros produtos, afirmava o pontífice. Ele encorajava a uma maior solidariedade entre as nações ao tratar os problemas ecológicos e examinar nosso estilo de vida, modelos de consumo e produção.
Mais uma vez ele advertiu contra o panteísmo ou o paganismo em que se considera que nossa salvação só pode ser alcançada no mundo natural. Bento XVI estabelecia que a Igreja tem fortes reservas sobre uma visão ecocêntrica ou biocêntrica do meio ambiente.
O perigo dessas posturas é que não veem diferença alguma entre a pessoa humana e as demais criaturas vivas.
“Dessa forma, é anulada na prática a identidade e o papel superior do homem, favorecendo uma visão igualitária da dignidade de todos os seres vivos”, advertia.
Ao concluir a mensagem, Bento XVI observou que os cristãos contemplam o cosmos e as maravilhas da obra criadora do Pai e da obra redentora de Cristo. O cuidado do meio ambiente, o respeito pelos valores humanos e a vida, a solidariedade entre todos estão assim ligados à nossa fé em Deus, criador e redentor. Uma visão complexa do natural e do sobrenatural que vai além da ideia de ser simplesmente verde.

Fonte: Zenit.

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