sexta-feira, 25 de setembro de 2009

Religião na época da globalização: crer sem pertencer

Entrevista com o professor Joan-Andreu Rocha Scarpetta

Por Miriam Díez i Bosch

Os jornalistas que informam sobre as religiões encontram-se frequentemente sem fontes confiáveis. Também enfrentam realidades complexas sem dispor de instrumentos para analisá-las e com linguagens críticas e difíceis de transmitir ao público. O resultado é uma informação religiosa que não alcança a qualidade suficiente.
Um seminário para jornalistas, organizado pelo Instituto Internacional de Ciências Sociais (IICS) em São Paulo, analisou este tema nos dias 8 e 9 de setembro. Entrevistamos um dos expoentes que apresentou a “radiografia” das religiões no mundo, o Prof. Joan-Andreu Rocha Scarpetta, vice-decano de jornalismo da Universidade Abat Oliba CEU, de Barcelona.
Rocha, que dirige em Roma o mestrado em “Igreja, Ecumenismo e Religiões” no Ateneu Pontifício Regina Apostolorum, sublinha a “lightização” da religião e a tendência a “crer sem pertencer”, duas chaves para entender as tendências sociais.
“As religiões têm maneiras privilegiadas de comunicar-se, o que não significa que seus líderes ou representantes tenham de ser especialistas mediáticos”, indica Rocha, que trata do vínculo entre comunicação e religiões no curso “Mídia, Ecumenismo e Religiões” na Pontifícia Universidade Gregoriana.--As religiões se globalizaram. Isso é positivo? --Rocha: A globalização produziu o desaparecimento das fronteiras religiosas e as religiões mundiais hoje estão presentes em todos os lugares.
Produziu-se o que os sociólogos chamam de um “passo da religião à espiritualidade”: as formas tradicionais religiosas de adesão estão mudando e se passa, em alguns contextos, de uma experiência religiosa organizada a uma forma de fé e de espiritualidade personalizada, o que eu chamaria de “lightização” da religião, por seu aspecto “light”, superficial.
--Tão “light” é a religião, que crença e prática se diluem. Estaria de volta o “sou crente, mas não praticante”?
--Rocha: Hoje se torna mais evidente que se crê sem pertencer e se pertence sem crer: a maioria das religiões enfrenta a polarização de ter pessoas espirituais que não pertencem a tradições religiosas e membros culturais que não são crentes.
Volta-se às identidades religiosas. Diante de um panorama de incerteza cultural, as identidades religiosas tendem a definir-se de maneira extrema: fundamentalismo ou transcendentalismo místico.
Comunicativamente, dá-se uma tendência interessante: o ágora mediático se converteu em um novo espaço para os encontros religiosos.
Outra característica das religiões hoje é a tensão entre duas formas de representação religiosa: a institucional e a carismática, nem sempre em harmonia. E isso pode confundir os comunicadores.
--Os jornalistas que se ocupam de religião estão trabalhando mal?
--Rocha: Há excelentes profissionais que fazem a cobertura da religião de forma exemplar, mas também há muitos clichês. Quando falo com jornalistas que se ocupam de religião, costumo sugerir-lhes sempre que, ao fazer informes ou artigos sobre a temática religiosa, não se esqueçam do aspecto de pluralidade nas tradições religiosas, que contêm uma grande multiplicidade de grupos e sensibilidades.
Neste sentido, um evento como o de São Paulo é muito pertinente, pois os jornalistas carecem de estratégias, dados, contexto... E para os que lideram as comunidades, seria útil saber do que um jornalista precisa, o que não costuma ser uma homilia completa, mas uma manchete; e alguém a quem poder recorrer, que retorne as ligações, que lhe trate bem e não fuja dele.
--Existem jornalistas que consideram as religiões como estáticas e fora de moda.
--Rocha: As tradições religiosas estão vivas; são mutáveis e dinâmicas. Um jornalista não deveria só prestar atenção nas crenças dos grupos religiosos, mas em como estas são colocadas em prática. E verá como não são estáticas.
Além disso, verá que contêm elementos de comunicação: uma mensagem, muitas vezes um profeta, um livro... Mas em si, estes elementos não se integram no mundo mediático; é preciso procurar a forma de canalizá-los.
As religiões têm maneiras privilegiadas de comunicar-se, o que não significa que seus líderes ou representantes tenham de ser especialistas mediáticos. Uma esperança são os informadores que se dedicam à religião, tarefa que, se bem feita, torna-se um benefício enorme para a religião e para a qualidade da mídia.

Fonte: Zenit.

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