terça-feira, 19 de abril de 2011

Tempos difíceis para os dissidentes na China

“Este não está sendo um bom mês para os dissidentes na China”. Joshua Rosenzweig, da ‘Duihua Foundation’ (uma organização norte-americana para os direitos humanos na China) fez essa observação em um artigo publicado no dia 28 de março no ‘Wall Street Journal’, falando da dura repressão contra os opositores do regime político no país.

O que o autor destaca neste novo movimento repressivo das autoridades é “sua flagrante ilegalidade”. Enquanto alguns presos tiveram pelo menos um julgamento – afirma o estudioso – muitos outros nunca tiveram essa sorte, simplesmente “desapareceram”.

Segundo a organização ‘Chinese Human Rights Defenders’ (CHRD, com sede em Hong Kong), há pelo menos 54 dissidentes, ativistas pró-direitos humanos, intelectuais e advogados, presos até agora. No dia 7 de abril, isso aconteceu com a advogada Ni Yulan, que junto a seu marido Dong Jiqin, opõe-se há anos às desapropriações ilegais. A mulher, que vive em cadeira de rodas depois de ter sido espancada pela polícia em 2002, foi presa pela suspeita de “causar desordens” (AFP, 15 de abril).

O caso que provocou maior clamor foi a prisão de Ai Weiwei, um dos protagonistas do cenário artístico internacional. O dissidente, de 53 anos, foi detido no dia 3 de abril, no aeroporto de Pequim, antes de embarcar em um voo para Hong Kong. Desde então não se sabe quase nada sobre ele. Como contou o ‘Guardian’ (15 de abril), desde a quinta-feira, está também desaparecido um advogado amigo do artista, Liu Xiaoyuan. E desde 9 de abril, é impossível ter contato com o desenhista Liu Zhenggang, que trabalha para ‘FAKE’, o estúdio de Ai Weiwei em Pequim. Também sumiram um amigo de Ai Weiwei, Wen Tao, seu motorista e primo Zhang Jinsong, e seu contador Hu Mingfen.

Interrompeu o ensurdecedor silêncio do governo o porta-voz do ministério de Assuntos Exteriores, Hong Lei, no dia 7 de abril. “Segundo meu conhecimento, Ai Weiwei é suspeito de crimes econômicos, e o Departamento de Segurança Pública está realizando uma investigação de acordo com a lei”, disse, afirmando que a China é um Estado de direito (‘The New York Times, 7 de abril’). Como recorda o jornal, a expressão ‘suspeito de crimes econômicos’ usa-se frequentemente por parte da polícia chinesa para prender os dissidentes políticos do Partido Comunista. A mãe do artista, Gao Ying, de 78 anos, definiu essa acusação de “ridícula”. “Eles têm de dizer à família por que e onde está detido o meu filho”, disse a mulher.

Em dias anteriores, o jornal Wen Wei Po – de Hong Kong, conhecido por seus laços próximos com o governo central – acrescentou outra acusação. Ai Weiwei seria suspeito de difundir "pornografia" na internet. Além disso, o famoso artista é acusado de bigamia e de ter um filho ilegítimo. A irmã de Ai, Gao Ge, definiu a acusação de bigamia de "absurda", e sua esposa, Lu Qing, defende a reputação do marido. "Se eles têm todas essas evidências, por que não publicam?", disse ao Telegraph (14 de abril).

Ai Weiwei sabia que estava na mira do Partido Comunista. O artista, conhecido por ser o criador conceitual do Estádio Olímpico de Pequim – batizado de "Ninho do Pássaro" por sua forma particular – rapidamente se distanciou da forma como foram organizados para os Jogos de 2008 pelas autoridades chinesas. O terremoto de 12 de maio de 2008 – três meses antes da abertura dos Jogos Olímpicos – que devastou a província de Sichuan, foi a causa do aumento das tensões. O terremoto causou mais de 80.000 vítimas, incluindo muitas crianças e alunos de escolas que ruíram como papelão. De acordo com Ai, os edifícios escolares tinham sido construídos com materiais de sucata, como resultado da corrupção generalizada.

Por causa de sua crítica constante, em agosto de 2009, o artista foi severamente espancado na cabeça pela polícia, em seu quarto de hotel, na província de Sichuan, Chengdu. Ele sofreu uma hemorragia cerebral e, consequentemente, teve de passar por uma operação de emergência em Munique (Alemanha. Quando, mais tarde, em janeiro, seu novo estúdio foi demolido por ordem das autoridades, Ai Weiwei entendeu que a rede estava se fechando em torno dele e que talvez fosse hora de ir para o estrangeiro, embora a ideia não o agradasse. Como filho de Ai Qing – um famoso poeta e pintor exilado na era de Mao Tse-tung, em primeiro lugar na Manchúria e, posteriormente, em Xinjiang – Ai Weiwei sabia que estava despertando a ira de Pequim. De acordo com o ‘Berliner Zeitung’ (29 de março), o artista tinha dado os primeiros passos para abrir um estúdio em Oberschöneweide, um subúrbio de Berlim, embora pareça pouco provável que ele irá inaugurá-lo no futuro próximo.

Atrás do punho de ferro, que coincidiu com a época de grandes encontros políticos na China – em março foi realizada em Pequim a Assembleia Nacional do Povo – preocupa muito que o vírus "norte-africano" da "revolução de jasmim” chegue à China. A paranóia da segurança e da estabilidade interna tem feito que palavras como "jasmim", "hoje", "amanhã" não possam ser utilizadas na internet na China. A censura inclusive bloqueou um vídeo da canção tradicional chinesa "Como é bonita a flor de jasmim", cantada pelo presidente Hu Jintao, durante uma visita ao Quênia em 2006.

A repressão também atua contra aqueles que criticam a lei infame do "filho único", como evidenciado pela crueldade contra a ativista Mao Hengfeng, comprometida desde 1988 na luta contra a política de planejamento familiar que existe no país. Também a fé deixa Pequim aos nervos. Como refere a agência de notícias AFP, a polícia prendeu no dia 17 de abril dezenas de fiéis em uma das maiores igrejas "clandestinas" da China – a igreja protestante Shouwang, em Pequim – porque eles queriam celebrar a liturgia ao ar livre. Nesse sábado foi preso o pastor Jin Tianming, e em seguida solto, no domingo. Por causa da contínua interferência das autoridades, a comunidade de Shouwang não consegue encontrar um lugar estável de culto. Segundo ‘AsiaNews’ (1º de abril), as coisas não funcionam melhor em Guangzhou (ou Cantão, capital da província de Guangdong), onde a igreja de Tianyun deve parar suas atividades e a igreja de Rongguili, que possui cerca de 4.000 pessoas, está a ponto de ser fechada. A obsessão das autoridades chinesas de querer controlar tudo está causando atrito com a Santa Sé, que já reagiu à interferência das autoridades chinesas na vida da Igreja católica por meio da "Mensagem aos católicos da China", difundida na quinta-feira passada.

A Santa Sé manifestou sua profunda preocupação com a ordenação ilícita (ou seja, sem a aprovação papal), em 20 de novembro de 2010, do novo bispo da diocese de Chengde (província de Hebei), Dom Joseph Guo Jincai. O evento concluiu com a eleição de Dom José Ma Yinglin, bispo ilícito da diocese de Kunming (Yunnan), como presidente do Conselho Episcopal Chinês, e com Dom Johan Fang Xinyao, bispo de Linyi (Shandong), como chefe da Associação Patriótica, isto é, a única Igreja católica reconhecida por Pequim.

Como observou ‘AsiaNews’ no dia 6 de dezembro passado, o “modus operandi” das autoridades chinesas por ocasião desses eventos recorda os tempos da infame “Revolução Cultural”. Dezenas de bispos foram obrigados a participar da assembleia e também da ordenação de Dom Jincai. Foram usados métodos de violência para “convencer” os oito bispos em comunhão com o Papa a ir à cerimônia. Estas “situações de crise” – expressão usada na sexta-feira passada pelo porta-voz vaticano, padre Federico Lombardi – coloca o Vaticano diante de um dilema: buscar o compromisso com Pequim e ser clemente com os bispos que obedeceram às autoridades, seguindo, portanto, o caminho da “Ostpolitik” do cardeal Agostino Casaroli (1914-1998), como propôs o padre Jeroom Heyndrickx no número de março da Fundação Ferdinand Verbiest (‘UCA News’, 1º de abril), ou eleger a linha da firmeza e da fidelidade ao pontífice, como fez o cardeal Joseph Zen Ze-kiun, bispo emérito de Hong Kong.

Fonte: Zenit.

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