O padre Paul Gunter, professor do Pontifício Instituto Litúrgico de Roma e Consultor do Ofício de Celebrações Litúrgicas do Sumo Pontífice, oferece-nos neste artigo uma detalhada descrição das orações que o sacerdote pode utilizar para se preparar para a celebração litúrgica da Santa Missa e para fazer a Ação de Graças depois dela. Estas orações se encontram, com diferente extensão, nos missais das duas formas do Rito Romano. O artigo evidencia a importância de uma preparação para a celebração e do devido agradecimento posterior, seja em base do vínculo entre o exemplo de Cristo e a vida do sacerdote, quer pelos efeitos benéficos que este costume produz também nos fiéis que participam da liturgia (Mauro Gagliardi). * * *
Por Paul Gunter, OSB
1. A oração íntima e pessoal de Jesus
Para o sacerdote, frutificar na vida e no ministério depende da união com Deus, união que está na base também do fato de que os fiéis se dirijam a ele para que reze por eles. Jesus Cristo confiou àqueles que o seguiam mais de perto uma palavra que esclarece o sentido de todo o bem que fariam: "Eu sou a videira e vós, os ramos. Aquele que permanece em mim, como eu nele, esse dá muito fruto; pois sem mim, nada podeis fazer". O próprio Senhor Jesus, no contexto dos muitos milagres realizados, estabeleceu um tempo para estar só, para dedicar à oração a seu Pai celestial. Para Jesus, a oração oficial da liturgia era sustentada por uma vida interior na qual a reserva apoiava essa intimidade que nutre a oração pessoal. As dimensões eclesial e comunitária se reforçam por uma relação pessoal similar com Deus, que cada fiel espera poder aprofundar.
A busca de Deus, que dá significado à vida dos que o amam, serve de recordação quotidiana do fato de que toda bênção provém e ao mesmo tempo se dirige para o Deus onipotente. A Sagrada Escritura descreve de forma vívida o alimento que Jesus tomava de sua vida de oração escondida: "ele se retirava a lugares desertos para orar" (Lc 5, 16). Do mesmo modo, notamos a importância dos diferentes momentos do dia, pelo fato de que Jesus se mostra particularmente atento ao silêncio da oração, em que busca a vontade do Pai. Momentos similares animam um especial recolhimento e uma proximidade ininterrupta: "De madrugada, quando ainda estava bem escuro, Jesus se levantou e saiu rumo a um lugar deserto. Lá, ele orava" (Mc 1, 35); "Depois de despedi-las, subiu à montanha, a sós, para orar. Anoiteceu, e Jesus continuava lá, sozinho" (Mt 14,23).
2. A oração íntima e pessoal do sacerdote
O sacerdote, consciente de participar na obra de Cristo, esforça-se por seguir seu exemplo, por guiar o santo povo de Deus ao Pai, através de Cristo no Espírito Santo. Ele sabe muito bem que, dado que seus defeitos danificam a credibilidade de seu testemunho, deve pedir com não menor urgência a Deus que infunda nele as virtudes próprias de seu estado. Parte da homilia proposta no rito de ordenação do presbítero instrui aquele que vai ser ordenado desta forma: "Assim continuarás a obra de santificação de Cristo. Através de teu ministério, o sacrifício espiritual dos fiéis se faz perfeito, porque está unido ao sacrifício de Cristo, é oferecido através de tuas mãos em nome da Igreja de forma incruenta sobre altar, na celebração dos sagrados mistérios. Reconhece o que fazes, imita aquele que tocas, para que, celebrando o mistério da morte e ressurreição do Senhor, possas mortificar em ti mesmo todos os vícios e preparar-te para caminhar em uma vida nova" [1].
Vê-se, por isso, que o motivo de uma particular preparação do sacerdote antes da Missa e o agradecimento depois dela reside no benefício para a Igreja inteira, porque o sacerdote que santifica o povo cristão necessita em primeiro lugar de ser moldado pelo espírito de santidade. Sempre é de ajuda para o sacerdote tomar um momento para considerar os textos que rezará durante a Missa, seja no dia em que a assembleia participará, ou não. Oportunas reflexões prévias sobre os textos podem estimular um desejo mais profundo de Deus. A preparação textual constitui uma preparação litúrgica coerente para a Santa Missa. Um sacerdote que cultiva o silêncio pessoal no tempo que precede e que segue à Santa Missa, com sua própria disposição animará o espírito de meditação.
Um sacerdote em atenção pastoral poderia ter de lutar para estabelecer o silêncio desejável em toda sacristia, especialmente se se apresenta a necessidade de ter de receber nela os fiéis. Mas precisamente para ele em particular, os textos de preparação antes da Missa e de agradecimento depois desta podem ser rezados em qualquer momento. Estes reconhecem também as limitações de tempo e por isso se apresentam como um apoio espiritual mais que como uma imposição de obrigação sobre o sacerdote que tenta celebrar a Missa de modo mais reverente possível. Deve-se assinalar que a rubrica que se encontra sob os títulos da Praeparatio ad Missam e da Gratiarum Actio no Missal de 1962 reconhece estas exigências concretas do sacerdote [2]. Nenhum ato de amor, por definição, é apressado. Tendo oferecido o supremo sacrifício do amor de Cristo, é de esperar que um sacerdote seja movido a fazer o que seja possível para encontrar um tempo, ainda que seja breve, para uma ação de graças depois da Missa. E se sentirá reforçado por tê-lo feito.
A preparação de um sacerdote para a Missa será ulteriormente apoiada pelo ciclo da Liturgia das Horas, que enriquece a vida de todo sacerdote. A antiga sabedoria do Ritus Servandus in Celebratione Missae, que se encontra ainda na primeira parte do Missal de 1962, presume a importância intrínseca do Ofício Divino para a vida interior do presbítero. Esta estabelecia que o Mattutino e as Laudes deveriam estar completos antes da celebração. Também se deve dizer que o contexto dessa prescrição secular não podia ter presente a Missa da tarde [3].
Dado que a Missa celebra-se atualmente em qualquer hora do dia litúrgico, já não se aplica esta norma de modo restritivo, no entanto, os Princípios e Normas para a Liturgia das Horas explicam atentamente a conexão entre a celebração da Eucaristia e a Liturgia das Horas: "Cristo mandou: ‘há que rezar sempre, sem nunca desistir'(Lc 18, 1). Por isso, a Igreja, obedecendo fielmente a este mandato, não cessa nunca de elevar orações e nos exorta com estas palavras: ‘Por meio de Jesus, ofereçamos a Deus um perene sacrifício de louvor' (Hb 13, 15). A este preceito, a Igreja responde não só celebrando a Eucaristia, mas também de outras formas, e especialmente com a Liturgia das Horas, a qual, entre as demais ações litúrgicas, tem como característica, por antiga tradição cristã, santificar todo o transcurso do dia e da noite" [4].
3. A Praeparatio ad Missam
3.1 A comparação dos textos oferecidos para a Praeparatio mostra que as próprias orações estão incluídas nas duas formas do Rito Romano, ainda que tenham sido reduzidas a quatro no Missale Romanum de 1970. Neste, encontramos a oração Ad Mensam de Santo Ambrósio; a Omnipotens sempiterne Deus, ecce accedo de São Tomás de Aquino; uma oração à Beata Virgem Maria, O Mater pietatis et misericordiae; e a Fórmula de Intenção Ego volo celebrare Missam [5]. À raiz de uma primeira reforma das indulgências feita depois do Concílio Vaticano II e publicada no Enchiridion das Indulgências de 1968, não se mencionam as indulgências que foram unidas à recitação destas orações por Pio IX, cujos detalhes tinham sido publicados no Missal de 1962.
3.2 Amplos textos adornam esse Missal, a antífona Ne reminiscaris pede a Deus que seja misericordioso apesar de nossos pecados e dos daqueles que nos precederam. Esta vai seguida dos salmos 83, 84, 85, 115 e 129. O Kyrie eleison, Christe eleison, Kyrie eleison e o Pater noster, cujas duas últimas linhas formam o início de uma série de versículos, são seguidos por um número de orações breves. Em alguns manuais devocionais, estas sete orações se atribuem a Santo Ambrósio e estão assinaladas aos diferentes dias da semana. Seja como for, pelo modo como estão colocadas no Missal, considera-se que se devem dizer sucessivamente sob uma única conclusão. Todas, exceto a sétima, concentram-se sobre a obra de santificação do Espírito Santo. A sétima é seguida por uma doxologia mais longa, que conclui a série. A primeira reza para que o Espírito Santo resplandeça em nossos corações, para que possamos celebrar dignamente os santos mistérios. A segunda pede que possamos amar a Deus perfeitamente e louvá-lo dignamente. A terceira, que possamos servir a Deus na castidade e pureza de espírito, enquanto que a quarta implora ao Paráclito que ilumine nossas mentes. A quinta pede a força do Espírito Santo para expulsar as forças do inimigo. A sexta pede a sabedoria e a consolação, e a última pede a Deus que nos purifique e que faça de nós o lugar de sua morada.
3.3 A extensa Oratio Sacerdotis ante Missam está dividida no Missal em sete partes, uma por cada dia da semana, e forma uma meditação orante sobre a imitação das virtudes de Cristo, Sumo Sacerdote. Seu significado é tão confortante como exigente. A relevância de seus diversos temas é adequada a seu estilo literário, que é insistente e íntimo. No domingo, o sacerdote pede ao Espírito Santo que o ensine a tratar os santos mistérios com reverência, honra, devoção e íntimo temor. Na segunda-feira, concentra-se sua necessidade de castidade perfeita, enquanto que na terça-feira, o sacerdote reconhece sua própria indignidade ao celebrar a Missa e, enquanto proclama sua fé no que Deus pode suprir quando lhe falte, pede para perceber sua presença enquanto celebra e também ser rodeado pelos anjos. Na quarta-feira, sai à luz o elenco das necessidades sociais das pessoas pelas quais Cristo derramou seu Sangue. Na quinta-feira, o sacerdote, enquanto implora a misericórdia divina, recorda como a providência socorre a fragilidade humana: "Tu amas tudo o que existe, e não deprecias nada de quanto fizeste" [6]. Na sexta-feira, o sacerdote reza especialmente pelos defuntos e no sábado reflete sobre o grande dom do Santíssimo Sacramento e suplica que este lhe possa conceder a ver a Deus face a face.
3.4 O Ad Mensam de Santo Ambrósio pede que o Corpo e o Sangue possam perdoar ao sacerdote seus pecados e protegê-lo de seus inimigos. A Oração de São Tomás de Aquino, em contrapartida, pede que o poder curador do Santíssimo Sacramento possa preparar o sacerdote para a visão eterna de Deus. Na Oração da Beata Virgem Maria, o sacerdote reza não só por si mesmo, mas por todos seus irmãos que celebram a Missa nesse dia em todo o mundo. Seguem orações a São José, a todos os anjos e santos e, finalmente, uma oração ao santo em honra do qual será celebrada a Missa. A Fórmula de Intenção recorda ao sacerdote a intenção da Igreja a respeito da celebração da Missa, assim como seu papel dentro da mesma. O sacerdote não opera sozinho. O que ele realiza foi entregue por Cristo a sua Igreja, confirmado pelo Magistério e apoiado pela Tradição. O sacerdote faz presente o Corpo e o Sangue de Cristo. Ele segue o rito da santa Igreja Católica. Seu objetivo é louvar a Deus e a Igreja celeste, enquanto reza pela terrena, e em particular por todos aqueles que se encomendaram a suas orações, como também pelo bem-estar de toda Igreja Católica. Depois, ao rezar por todos os fiéis, o sacerdote pede que o Senhor conceda a ele e a todos alegria com paz, mudança de vida, um espaço de verdadeira penitência, a graça e o consolo do Espírito Santo e a perseverança nas boas obras.
4. A Gratiarum Actio post Missam
4.1 O corpo de textos que forma o agradecimento após a Missa mostra amor, humildade e fé que se exaltam no dom sublime da Santíssima Eucaristia. O Missale Romanum de 2002 contém a Oração Universal atribuída ao Papa Clemente XI e a Ave Maria. Ademais, em comum com o Missal de 1962, contém a Oração de Santo Tomás de Aquino; as Aspirações ao Santíssimo Redentor ou Anima Christi; a Oferenda de si, ou Suscipe; a Oração ante Nosso Senhor Jesus Cristo crucificado, En Ego; e a Oração à Beata Virgem Maria. A estes textos no Missal de 1962 se anexavam as indulgências dos papas Pio X, XI e XII, enquanto que alguns textos do Missale Romanum de 2002 foram incluídos também no Enchiridion das Indulgências.
4.2. No Missal de 1962, uma antífona precede ao Benedicite (cf. Dn 3,56-58) e ao Salmo 150. Observando a própria estrutura da Preparação à Missa, o Kyrie eleison e alguns versículos abrem o caminho para algumas orações. A primeira delas reza para que, como os três jovens foram tirados ilesos das chamas, assim possam os servos do Senhor evitar as feridas do pecado. A segunda pede que as obras boas que Deus começou em seus servos possam chegar a seu cumprimento, enquanto que a terceira, que tem um tema semelhante à primeira, é uma oração a São Lorenzo, diácono e mártir, a quem busca vencer o sofrimento. As devoções que o sacerdote pode recitar pro opportunitate possuem expressões semelhantes aos pedidos de proteção em nossa viagem para o céu. Após a oração de São Tomás há outra (alia oratio) e o hino métrico Adoro Te, segue a amada oração do Anima Christi. O Suscipe e o En Ego precedem outra oração, que pede que a Paixão de Cristo seja a força do sacerdote, sua defesa e glória eterna. Antes das orações a São José e ao santo em honra do qual se celebrou a Missa, a Oração à Beata Virgem Maria oferece a Jesus, que foi recebido na Santíssima Eucaristia, à Virgem Mãe, para que Ela possa voltar a oferecer-lhe no supremo ato de adoração (latreia), o culto perfeito, à Santíssima Trindade.
5. Conclusão
O Ordenamento Geral do Missal Romano estabelece: "É por isso de suma importância que a celebração da Missa, ou Ceia do Senhor, esteja ordenada de tal forma que os sagrados ministros e os fiéis, participando nela cada um segundo sua própria ordem e grau, tragam abundância dos frutos pelos quais Cristo institui o Sacrifício eucarístico de seu Corpo e de seu Sangue e o confiou, como memorial de sua Paixão e ressurreição, à Igreja, sua amadíssima Esposa" [7]. A preparação do sacerdote para a Missa e o ato de ação de graças sucessivo se completam mutuamente. Estes nutrem a reverência nos corações e nas mentes dos fiéis que são ajudados a participar com maior intensidade na liturgia celebrada por um sacerdote que se beneficiou da oportunidade de recolhimento. O que anima a preparação prévia promove também a ação de graças sucessiva à Missa. Ambas guiam continuamente a Igreja para e a partir do Sacrifício eucarístico que celebra e faz presente os frutos do mistério pascal até que Cristo volte no fim dos tempos.
Fonte: Zenit.
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