As palavras de Bento XVI no livro-entrevista a ser lançado reconhecem o uso do preservativo em “casos singulares justificados”. De qualquer forma, não supõem “uma mudança revolucionária” no ensinamento da Igreja; são uma confirmação de seu Magistério, esclareceu a Santa Sé.
É o que explica o padre Federico Lombardi S.J., diretor da Sala de Imprensa da Santa Sé, em um comunicado emitido este domingo, para comentar a grande quantidade de informação veiculada no mundo após o L’Osservatore Romano antecipar nesse sábado algumas palavras que o Papa dedica ao tema da sexualidade, no livro-entrevista “Luz do mundo”.
Ao final do capítulo décimo do volume, realizado pelo escritor e jornalista alemão Peter Seewald, que chega às livrarias no dia 23 de novembro em vários idiomas, o pontífice responde a duas perguntas sobre a luta contra a SIDA/AIDS e o uso do preservativo, que se remontam à discussão que seguiu às palavras pronunciadas pelo Papa no avião que o levava a Camarões e Angola, a 17 de março de 2009.
Com as declarações que o livro publica – esclarece o porta-voz vaticano –, “o Papa não reforma ou muda o ensinamento da Igreja, mas o reafirma, colocando-se na perspectiva do valor e da dignidade da sexualidade humana, como expressão de amor e responsabilidade”.
“Ao mesmo tempo – acrescenta –, o Papa considera uma situação excepcional em que o exercício da sexualidade representa um verdadeiro risco para a vida do outro. Nesse caso, o Papa não justifica moralmente o exercício desordenado da sexualidade, mas considera que a utilização do preservativo para diminuir o perigo de contágio é ‘um primeiro ato de responsabilidade’, ‘um primeiro passo para o caminho para uma sexualidade mais humana’, em lugar de não utilizá-lo, colocando em risco a vida de outra pessoa”.
Neste sentido – sublinha –, o raciocínio do Papa “não pode ser definido como uma mudança revolucionária”
De fato, recorda o porta-voz, “vários teólogos moralistas e autorizadas personalidades eclesiásticas afirmaram e afirmam posições análogas”.
O padre Lombardi não cita nomes, mas entre eles destaca-se o cardeal Georges Cottier, que foi teólogo da Casa Pontifícia de João Paulo II e do próprio Bento XVI, que em uma entrevista concedida em 2005 afirmou que “em situações particulares, e penso em meios onde circula a droga, ou há uma grande promiscuidade humana e muita miséria, como ocorre em algumas zonas da África e Ásia, nesses casos, o uso do preservativo pode ser considerado como legítimo”.
Sobre este tema, o cardeal Javier Lozano Barragán, presidente emérito do Conselho Pontifício para a Pastoral no Campo da Saúde, anunciou em coletiva de imprensa de 21 de novembro de 2006 a entrega de um estudo à Congregação para a Doutrina da Fé, em resposta ao interesse do Papa.
"Humanae Vitae" hoje
As antecipações de L'Osservatore Romano apresentam também uma apreciação do Papa sobre a Humanae Vitae, a encíclica que Paulo VI publicou sobre esses temas em 1968.
“As perspectivas da Humanae Vitae continuam sendo válidas, mas outra coisa é encontrar caminhos humanamente praticáveis – assegura o Papa –. Creio que haverá sempre minorias intimamente convencidas da exatidão dessas perspectivas e que, vivendo-as, ficarão plenamente satisfeitas de modo que poderão ser para outros um fascinante modelo a seguir. Somos pecadores”.
“Mas não deveríamos assumir este fato como uma instância contra a verdade, quando essa alta moral não é vivida. Deveríamos buscar fazer todo o bem possível, e apoiar-nos e suportar-nos mutuamente. Expressar tudo isso também desde o ponto de vista pastoral, teológico e conceitual, no contexto da atual sexologia e pesquisa antropológica, é uma grande tarefa à qual é necessário se dedicar mais e melhor”, acrescenta o Papa no livro.
Uma vez esclarecido que o Papa confirmou o Magistério até agora exposto, ao fazer referência às palavras sobre o uso do preservativo em “casos singulares justificados”, o comunicado do padre Lombardi assinala que “é verdade que não as havíamos escutado ainda com tanta clareza dos lábios de um Papa, se bem de uma maneira coloquial e não magisterial”.
Com estas novas declarações, considera o sacerdote jesuíta, “Bento XVI nos dá, portanto, com valentia, uma contribuição importante para esclarecer e aprofundar uma questão debatida há tempos”.
“É uma contribuição original – indica –, pois por um lado mantém a fidelidade aos princípios morais e demonstra lucidez na hora de rejeitar um caminho ilusório, como a ‘confiança no preservativo’; e, por outro lado, manifesta no entanto uma visão compreensiva e de amplo horizonte, atenta para descobrir os pequenos passos – ainda que sejam só iniciais e ainda confusos – de uma humanidade espiritual e culturalmente com frequência muito pobre para um exercício mais humano e responsável da sexualidade”.
Em referência em concreto às palavras que o Papa pronunciou em sua viagem à África, seu porta-voz esclareceu que com esta nova intervenção, o sucessor de Pedro “confirma com clareza que nessa ocasião não tinha querido tomar posição sobre o problema dos preservativos em geral, mas que tinha querido afirmar com força que o problema da SIDA/AIDS não se pode resolver unicamente com a distribuição de preservativos, pois é necessário fazer muito mais: prevenir, educar, ajudar, aconselhar, estar junto das pessoas, seja para que não fiquem doentes, seja por que ficaram doentes”.
O bispo de Roma “observa que também no âmbito não eclesial se desenvolveu uma consciência análoga, como o demonstra a chamada teoria 'ABC' (abstinence, be faithful, condom), em que os dois primeiros elementos (abstinência e fidelidade) são muito mais determinantes e fundamentais para a luta contra a SIDA/AIDS, enquanto que o preservativo se apresenta em última instância como uma escapatória, quando faltam os outros dois elementos. Portanto, deve ficar claro que o preservativo não é a solução do problema”.
Segundo Lombardi, com esta nova entrevista, o Papa “amplia o olhar e insiste no fato de que concentrar-se unicamente no preservativo significa banalizar a sexualidade, que perde seu significado como expressão de amor entre pessoas e se converte em uma ‘droga’. Lutar contra a banalização da sexualidade é “parte do grande esforço para que a sexualidade seja valorizada positivamente e possa exercer seu efeito positivo no ser humano em sua totalidade”.
Fonte: Zenit.
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