Nos últimos séculos, passamos por várias “idades” segundo alguns estudiosos. Primeiro a idade da religião, depois da filosofia que suplantou aquela e em seguida da ciência e da técnica. As teorias e leis científicas é que hoje tem prestígio. A filosofia, a religião são desacreditadas. O problema da técnica aliada à economia não é mais produção, mas capacidade de consumo. A ciência avançou de modo fantástico, porém, desconfia-se que existem outros meios de conhecimento ao lado da ciência (inteligência emocional). A ciência permite efeitos cada vez maiores, mas cada vez mais, fica muda sobre o sentido da realidade. O homem não se satisfaz com suas conquistas.
Em meio a esta situação, Jesus Cristo parece ser aos olhos de alguns, alguém distante, lá da idade da religião. Talvez muitos, mais jovens, já não saberiam dizer quem foi Jesus Cristo. No entanto, a Igreja o celebra, e nestes dias, revive o mistério que envolve seu sofrimento, morte e ressurreição. A Igreja foi o fato concreto surgido após a morte de Jesus e através dela o Evangelho se propagou. Mas o que pode significar para o homem de hoje a mensagem de Jesus? Qual o significado de seu sofrimento e morte?
Pode significar muito, porque em Jesus o homem pode intuir e perceber o sentido da existência. Jesus Cristo revela o ser humano a ele mesmo, basta dar-lhe uma chance, tomar conhecimento de sua mensagem, debruçar-se um pouco sobre os acontecimentos que celebramos nesta semana santa, para perceber que seu significado vai além de qualquer história já ouvida.
Em sua obra clássica, O poder do Mito, Joseph Campbell, respondendo à pergunta, se acreditava que aquele que perde sua vida ganha a vida, como Jesus ensinou, diz: “Acredito, desde que se perca a vida em nome de algo”.E mais adiante continua: “Desde que existe tempo, há sofrimento.Perda, morte, nascimento, perda, morte – e assim por diante. Ao contemplar a cruz, você está contemplando um símbolo do mistério da vida”. A cruz é símbolo de uma vida entregue para que todos tenham vida e vida em abundância.
Jesus tem tudo a dizer para o homem de hoje que busca a liberdade acima de tudo, desde o lazer até as drogas, sem no entanto, descobrir o que é realmente liberdade. A liberdade, a busca da liberdade, ultrapassa nossa vida puramente biológica, para nos fazer avançar na transcendência e na eternidade. A pessoa é aquilo que no ser humano transcende a morte, depois da morte algo de nosso subsiste e que não é sujeito à morte.
Jesus crucificado, que entrega sua vida, num gesto de profunda solidariedade e serviço, desperta em nós a compaixão, o amor. O outro nos questiona e, especialmente o outro que sofre. O pobre, o fraco, o pecador, nos questiona e desafia. Se você se fechar em seu egoísmo, no seu individualismo, permanecerá estéril, escravo de si mesmo. Mas se você se abrir ao diálogo e ao encontro com o outro, você vai sofrer, mas vai se redimir e despertar para o amor. E em última análise é o amor que salva, o amor como entrega, oblação e serviço. E aí se encontra o sentido da vida que é ser livre no encontro com o outro. Mesmo porque sozinho não existe liberdade, mas fuga na solidão que não realiza ninguém.
O sofrimento de Cristo na cruz não pode ser visto como castigo de Deus. Lido na perspectiva libertadora, o sofrimento pode ser caminho de vida, como o grão que cai na terra e morre para gerar a espiga. Deus tem a força de transformar o sofrimento em alegria. A cruz de Jesus representa a fidelidade de Jesus ao plano de Deus que é a fraternidade universal, a civilização do amor. A morte de Jesus foi por solidariedade com os pecadores, fracos e miseráveis. Assim, Jesus mostra que Deus é bondade, e compaixão. E se Deus é assim, abre-se uma esperança infinita para a humanidade.
A ressurreição de Jesus é a alegria luminosa de viver na esperança. A morte foi vencida pela vida. A morte não tem a última palavra. A vitória final é da vida. Em meio a uma geração como a nossa que parece cultuar as estruturas de morte, não obstante desenvolver meios incríveis de se promover a vida, tanto na medicina como na biologia, a humanidade precisa de alguém que lhe assegure que a vida é mais forte que a morte, que vida verdadeira quer dizer vida no amor. E Jesus faz isto em um grau supremo, como somente Deus pode fazê-lo. E como dizia muito bem D. Bonhoffer: somente um Deus que sofre serve para o homem. Portanto, Jesus Cristo é sempre atual. Feliz Páscoa a todos!
Fonte: Dom Pedro Carlos Cipolini
Bispo de Amparo - SP
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