sexta-feira, 31 de maio de 2013

As reduções jesuítas foram um verdadeiro triunfo da humanidade



Reproduzimos a seguir o discurso do cardeal Marc Ouellet, presidente da Pontifícia Comissão para a América Latina e prefeito da Congregação para os Bispos, feito na abertura da semana de celebrações organizada pela Embaixada do Paraguai junto à Santa Sé, na última segunda-feira, 27 de maio, na Real Academia da Espanha em Roma.

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Eu me sinto muito honrado por presidir este ato de abertura das três jornadas que marcarão este importante evento promovido pela Embaixada da República do Paraguai perante a Santa Sé, com o especial auspício da Comissão Pontifícia para a América Latina, da Real Academia da Espanha em Roma e do Meeting para a Amizade entre os Povos. Seu objetivo é comemorar o Bicentenário da Proclamação da República do Paraguai, o 25º aniversário da Canonização de São Roque González de Santa Cruz e o 25º aniversário da visita de Sua Santidade, o beato João Paulo II, com uma série de atos de importante envergadura cultural e espiritual. Aproveito esta bela ocasião, também, para cumprimentar muito cordialmente o diretor desta ilustre academia que nos hospeda, os senhores embaixadores que nos acompanham e os sacerdotes, religiosos, religiosas e leigos que quiseram participar do evento.
E como não poderia ser diferente, este ato de abertura do evento se realiza conjuntamente com a inauguração da exposição “As reduções jesuítas do Paraguai: uma aventura fascinante que perdura no tempo”. Partir das reduções e do testemunho de santos e mártires como Roque González de Santa Cruz é ir até as raízes da pátria paraguaia, mas não isoladamente, e sim no mais vasto território dos povos irmãos da bacia do Prata.
Sobre as reduções jesuítas do Paraguai foi escrito que elas “pareciam um triunfo da humanidade”. Quem as descrevia sinteticamente desse modo? Por acaso algum católico em euforia apologética? Não! Foram palavras, nada menos, que de Voltaire, no geral tão virulentamente agressivo contra a Igreja católica. Sim, as reduções foram um verdadeiro triunfo de humanidade, porque um punhado de jesuítas foi capaz de colocar as tribos guaranis em condições materiais, culturais e religiosas de afirmar e valorizar a própria humanidade. No extraordinário laboratório e na experiência fascinante das reduções, a evangelização e a promoção humana se combinaram indissociavelmente, sem necessidade de muitas teorizações, movidas apenas pelo amor à vida e ao destino dos povos indígenas. Não houve, em todo o tempo colonial, qualquer experiência semelhante de educação e de instrução dos indígenas, de edificação de comunidades de pessoas e famílias e de comunhão de bens, de formação técnica e cultivo das artes, de crescimento artesanal e industrial, de produtividade no trabalho agrícola, de participação dos indígenas na organização da vida coletiva e civil.
Os jesuítas chegaram e começaram a sua obra na vasta bacia do Prata no alvorecer dos anos 1.600. Vinte e cinco anos depois, já existiam no Guairá, entre as atuais províncias de San Pablo e Paraná, 13 reduções com mais de 100.000 indígenas. Em sua fase de estabilização e de apogeu, por volta de 1.700, os povoados misioneros do Alto Paraná e do Alto Uruguai já eram 30, com 5.000 indígenas cada um. Mas as missões do Paraguai não foram só o “foco de desenvolvimento” mais portentoso da bacia do Prata. Elas serviram como centro de experimentação e como guia para a fundação de uma rede de missões na América do Sul: nos llanos orientais da Colômbia, no Maranhão, nas planícies do Alto e Médio Amazonas, nas planícies de Chiquitos, no sudeste da Bolívia atual, e ainda no nordeste boliviano.
Que extraordinária força construtiva da fé vivida, comunicada, compartilhada! Não bastava protestar nem denunciar a opressão sofrida pelos indígenas; era necessária uma companhia, uma amizade, capaz de abraçar toda a sua vida, todas as dimensões da sua vida, e gerar assim uma obra de alta qualidade humana, as experiências surpreendentes de uma nova civilização em germe.
Eu acredito que podemos afirmar com muitas razões que a brutal expulsão de todos os jesuítas dos territórios submetidos às coroas espanhola e portuguesa, e a conseguinte dispersão dos povoados missioneiros, constituiu a destruição da mais importante experiência social de verdadeiro progresso em terras do “Novo Mundo” e uma das causas mais graves do seu posterior atraso. O povo paraguaio, porém, e os povos da bacia do Prata, continuam marcados no tempo por esta profunda experiência. “Uma aventura fascinante que perdura no tempo”, como bem diz o título da exposição que poderemos admirar aqui, graças à gentil disposição dos amigos do Meeting de Rímini, e que ficará ainda mais ilustrada pela experiência e pelas reflexões do reverendo pe. Aldo Trento, que tenta nada menos que reatualizar a obra das reduções na sua própria paróquia, ele que, ao mesmo tempo, é um grande estudioso das reduções jesuítas guaraníticas.
As missões jesuíticas me trazem à memória o fato de que nós temos hoje o primeiro jesuíta Sucessor de Pedro, que vem daquelas terras platinas e que nos chama a ir a todas as periferias humanas, sociais e culturais, para anunciar o Evangelho e difundir a força construtiva da caridade.
Cumprimento, pois, o senhor embaixador do Paraguai diante da Santa Sé, Sr. Esteban Kriskovic, por ter concretizado esta oportuna e importante iniciativa, que, em meio a comemorações tão significativas, permite voltar às melhores raízes e renovar o compromisso pelo serviço evangelizador e pela construção de condições de fraternidade e de justiça na vida dos povos.

Fonte: Zenit.

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