segunda-feira, 19 de julho de 2010

Velhos ícones, novas igrejas; a força de Bento XVI

A última semana de junho foi, por muitos motivos, um momento particular para a Igreja em Roma.
O anúncio da descoberta dos ícones mais antigos conhecidos dos apóstolos Pedro, Paulo e André atraiu grande parte da atenção mundial – graças em grande parte a alguns sagazes e tentadores anúncios prévios feitos pelo Vaticano.
Descobertas no teto de uma tumba nas catacumbas de Santa Tecla, próximo da Basílica de São Paulo Fora dos Muros, as imagens foram datadas da segunda metade do século IV. Foram descobertas utilizando uma importante técnica nova de laser, que queima grossos depósitos de carbonato de cálcio, mas deixando as cores escuras subjacentes das pinturas originais intactas.
A qualidade das imagens é impressionante, dada sua idade e quantidade de sujeira que teve de ser removida. Cada apóstolo aparece em medalhões nas esquinas do teto: São Paulo, cuja imagem foi a primeira que se descobriu no ano passado, é talvez a mais clara de distinguir. Parece um filósofo renascentista, com a cabeça calva e a barba pontiaguda. Os santos André e João, vestidos com aparatos romanos, mostram-se pensativos, enquanto São Pedro, com barba branca e grandes mechas de cabelo, aparece sereno e distinto.
Os arqueólogos fizeram a descoberta em um local considerado um dos mais improváveis da cidade: um simples subúrbio repleto de alguns dos piores exemplos da arquitetura dos anos 70. Mas, igual à maioria dos apóstolos, os romanos que viveram sobre estas imagens durante séculos foram gente simples.
Pouco antes deste anúncio, chegavam outras boas notícias para a Igreja Católica em Roma: os planos para construir 51 novas paróquias na cidade.
Gianni Alemanno, o prefeito, disse que as novas paróquias, financiadas com a colaboração do Vicariato de Roma, outras dioceses e doações de terrenos da Prefeitura da cidade, “não serão apenas centros de culto, mas também centros sociais para os subúrbios da cidade”.
“Somos muito conscientes – afirmou – de que as paróquias são frequentemente locais de encontro e de identidade nos bairros da cidade.”
É difícil imaginar que Roma, uma cidade em que se pode visitar uma igreja diferente em cada dia do ano, precise de mais igrejas. Mas há paróquias, como a de Santa Maria Rainha da Paz, em Tor Vergata, um subúrbio da cidade, que espera há mais de oito anos para encontrar um lugar permanente. Agora seus paroquianos poderão finalmente ter um, disse Alemanno.
Mas nem todo mundo está pulando de alegria pelas notícias. Os membros de outras confissões cristãs e religiões reclamam que também deveriam receber terrenos.
Alemanno se comprometeu, portanto, a “encontrar uma maneira de lhes dar terrenos”. A pertença religiosa, disse, é um “valor universal” e, portanto, responder a suas demandas é “sempre um enriquecimento para a sociedade”.
Esta resposta é característica de Alemanno, que tem sido um dos prefeitos atuais de Roma mais favoráveis à Igreja e às religiões. Antigo fascista reformado, tem sido coerente em seu apoio às preocupações da Igreja, não só em relação com questões práticas, mas também em sua batalha contra o laicismo radical.
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Um verdadeiro bávaro
Entre os muitos amigos de Bento XVI, os da Baviera são muito provavelmente os que melhor o conhecem.
Um deles é a professora Hanna Barbara Gerl-Falkowitz, catedrática de filosofia e religiões comparadas da Universidade de Dresde, que conhecia o Papa desde antes de ser nomeado arcebispo de Munich e Freising, quando era apenas o professor Joseph Ratzinger.
No mês passado, enquanto se encontrava em Roma para tomar parte em uma conferência sobre o filósofo católico Dietrich von Hildebrand, partilhou comigo algumas facetas de sua personalidade. Em concreto, recordou uma anedota particularmente divertida de quando se encontraram pela primeira vez.
Gerl-Falkowitz organizava uma conferência para 300 pessoas e tinha convidado o então professor Ratzinger para falar sobre Romano Guardini, grande intelectual católico alemão a quem Joseph Ratzinger admirava havia muito tempo. O lugar de encontro era o castelo Rothenfels, no alto de uma montanha próxima da cidade bávara de Wurzburg. "Foi em 1976”, recorda Gerl-Falkowitz. "Lembro o ano exato porque ele [o professor Ratzinger] tornou-se arcebispo de Munich um ano depois”.
“Eu tinha enviado um ajudante para recebê-lo na estação de trem, e este homem voltou dizendo: ‘O professor Ratzinger não estava, não o vi’. Mas eu tinha um castelo com 300 pessoas dentro e arrancava os cabelos. Estava desesperada. Deve saber que o castelo está situado no alto de uma escadaria rochosa”.
"Cerca de 20 minutos depois, estava de pé no cume e junto a mim havia uma cerca viva que começou a se mover. Então, primeiro vi uma bolsa, em seguida, duas mãos, e logo o cabelo branco – já tinha cabelo branco nesse tempo – do professor Ratzinger. Estava suando, esforçando-se para atravessar a cerca. Ele tinha subido a colina escarpada até chegar ao castelo. Eu queria que a terra me sugasse! Mas ele estava muito amável e sorridente. Disse-me: Ascensio in montem sacrum, que significa: “Ascensão à montanha sagrada".
“Estava fazendo alusão a Guardini, porque foi ele quem permitiu que este castelo fosse utilizado pela juventude católica alemã. Esse foi meu primeiro encontro com Joseph Ratzinger – seu cabelo esvoaçado, os papéis voando ao redor. Não sei se ele recorda disso, mas eu sim. Foi terrível pra mim a vergonha do desencontro por não recebê-lo corretamente”
Gerl-Falkowitz tem grande admiração pelo Santo Padre, e segue se surpreendendo com a força de seu caráter. “Ele está muito forte – afirma. Sempre me surpreende que, com tudo o que está acontecendo ao seu redor, com todas as suas atividades, este homem possa rezar com uma concentração incrível. Significa que está realmente próximo do Senhor – é minha impressão. E ele é muito simples. Toda sua inteligência é só uma espécie de envoltura, ao redor de uma simplicidade muito profunda e preciosa”.
“A primeira impressão que se tem dele é que é um pouco tímido, e isso é certo, pois vem de uma parte da Baviera – a antiga Baviera – onde as pessoas são tímidas, muito profundas e piedosas”
Gerl-Falkowitz diz que a recente crise na Igreja fez que o Santo Padre “sofresse muito” e “realmente sentisse”. Mas “ele é um crente forte”, afirma, e não tem nenhuma dúvida de que sua força de caráter e sua fé se verão através das tempestades.
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Edward Pentin é escritor independente; vive em Roma. Seu e-mail: epentin@zenit.org

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