O papa do diálogo, dos jovens e da comunicação, mas também da primeira visita oficial a uma sinagoga. “Não, senhorita, Wojtyla não foi o primeiro”: o rabino chefe de Roma, Riccardo Di Segni, brinca com a apresentadora no concerto organizado em 18 de maio pela Roma Capitale para encerrar os eventos comemorativos da beatificação de João Paulo II. Di Segni subiu ao palco do Auditorium della Conciliazione para falar do “feeling” especial do papa polonês com o judaísmo.
“Para sermos precisos”, disse ele, “o primeiro pontífice a visitar uma sinagoga foi Pedro”. No meio do público, de milhares de espectadores, havia uma delegação de judeus, composta, entre outros, pelo presidente da União das Comunidades Judaicas Italianas, Renzo Gattegna, e pelo assessor da Comunidade Judaica de Roma, Ruben Della Rocca, em representação do presidente, Riccardo Pacifici.
Alternaram-se no palco artistas famosos e testemunhas “especiais” do vínculo de Wojtyla com Di Segni durante os 27 anos do pontificado, como o ex-porta-voz vaticano Joaquín Navarro-Valls e Dom Slawomir Oder. Eles repassaram as “páginas viradas” por Wojtyla na história da relação entre ambas religiões.
Como em 13 de abril de 1986, quando João Paulo II atravessou o limiar do Templo de Roma. Di Segni, então jovem ministro do culto, se lembra assim do acontecimento: “Era a sensação de viver um momento histórico”. E tanta foi a surpresa “que não era pouca a perplexidade com os problemas protocolares a resolver. Tínhamos que criar tudo”. Não havia preparação: nunca tinha havido um precedente daquela transcendência.
Di Segni explica que era uma novidade absoluta aquele encontro entre o papa e o ex-rabino chefe de Roma, Elio Toaff, hoje com 96 anos: “Dizem que eu cantei, mas posso garantir que isso não corresponde à realidade. Aliás”, ironiza, bem ao seu estilo, dando a entender sua pouca capacidade para o canto, “não choveu naquele dia”. Inesquecível o abraço entre os dois, que sintetizava tantas palavras não ditas para desfazer outras tantas incompreensões. “Entre eles havia um feeling especial”, comenta Di Segni.
O próprio Toaff, em sua obra “Pérfidos judeus, irmãos maiores", escreve: “Entramos juntos no Templo. Passei pelo público silencioso, em pé, como num sonho, com o papa ao meu lado, e, atrás, cardeais, prelados e rabinos: uma comitiva insólita, certamente única na história da sinagoga. Subimos para a Tevá e nos voltamos para o público. E então explodiu o aplauso, irrefreável, quando o papa disse: “Sois nossos irmãos prediletos, e de certa forma, poderíamos dizer, nossos irmãos maiores”.
Não por acaso, o nome de Toaff, junto com o do então prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, cardeal Joseph Ratzinger, hoje o papa Bento XVI, e o do cardeal Stanisław Dziwisz, atual arcebispo de Cracóvia e durante quarenta anos secretário particular de Wojtyla, é um dos três publicados no testamento espiritual do pontífice polonês “como prova ulterior de um vínculo que vai além da oficialidade. Uma simpatia substancial que leva à amizade onde o perfil doutrinal pode criar problemas”.
O rabino ressalta o sentido da palavra "diálogo", que muitos observadores usaram para falar da ruptura de certas rigidezes do passado: “O diálogo entre judaísmo e cristianismo já estava bem encaminhado, mas era um diálogo principalmente entre eruditos e teólogos. Um diálogo em que faltava o aspecto humano, e Wojtyla foi capaz de captar essa necessidade”.
Em resumo, conclui Di Segni, “esse papa soube quebrar o gelo e hoje todos entendemos que o gesto dele mudou para sempre a atmosfera das nossas relações”.
Fonte: Zenit.
Nenhum comentário:
Postar um comentário