sábado, 6 de agosto de 2011

DEVORADORES DE PADRES

Não. Não se trata dos tupiniquins que acolheram de braços abertos o primeiro bispo enviado à Terra de Santa Cruz - Dom Pero Fernandes Sardinha - em 1552, e seduzidos pelo sobrenome do prelado, cozinharam-no em um panelão de pedra polida, temperado com louro e açafrão.
Falo de outros devoradores de padres.
Falo das comunidades paroquiais. Elas recebem a visita do senhor bispo que lhes apresenta o novo pároco. Entre incensos e sorrisos, abraços e aleluias, o senhor vigário toma posse. O bispo volta para sua casa e a guerra começa...
Os padres são ministros de Deus. Foram chamados pelo senhor, separados do mundo e ao mundo devolvidos para servir à comunidade dos “irmãos e das irmãs”, como exige que se diga a onda feminista. Mas os padres são homens - humanos.
Têm seus limites e suas carências.
Trazem na alma e na mente as marcas de sua história pessoal e familiar. Não são anjos. Tão pouco super - homens. Precisam de nossos cuidados...
Mas não é o que se vê. Uma vez empossado (ou empoçado?!) o novo pároco, começam as cobranças, os apelos, as exigências de uma comunidade faminta, absolvente, devoradora.
São inevitáveis as comparações com o antecessor. “O padre fulano fazia assim; o padre beltrano faz assado”. Manifestam-se os gostos pessoais. Ele não fala latim? Ele fala muito baixo. Ele grita demais. A missa dele é comprida demais. A missa “dele” é curta demais... Os movimentos tentam apossar-se do padre. Cobram sua presença em todas as reuniões: vicentinos & marianos & carismáticos & catecumenais & zeladoras & legionários & etc. etc. etc.
Ah! Sim... Não esqueçamos as várias pastorais: pastoral do dízimo, pastoral dos doentes, pastoral dos jovens, pastoral vocacional, pastoral dos mendigos; pastoral dos divorciados recasados... E as “equipes”? Equipe de liturgia, equipe de comunicação, equipe da Crisma, equipe do Batismo, equipe do som, equipe das flores e equipe de limpeza, equipe de representantes junto a CUT, aos sem-terra e aos refugiados curdos ... Ufa!
Pedi emprestada à minha filha sua calculadora financeira (a que tem mais zeros!) e andei fazendo uns cálculos: para estar presente a todas as reuniões - dada a hipótese de uma reunião mensal por movimento, equipe ou grupo - o onipresente vigário teria, por ano cerca de duas ou três noites livres para ver tv, visitar o velho pai ou ... reunir-se com os amigos...
E não é só isso! É o telefone que toca o dia inteiro. O padre está? O padre pode confessar? (Alguns ainda podem...) O padre vai celebrar hoje? O padre pode benzer o carro novo? O padre pode visitar o Léo e a Hortênsia que estão falando em separação? (Também, onde já se viu casar um leão com uma flor?)...
No meio da noite, batem à porta: alguém morreu e o assunto é do padre. No meio do almoço, batem à porta: o filho foi atropelado e o assunto é do padre. No sagrado recinto do banheiro, batem à porta: Dona Rosinha está no portão e não pode esperar...
E não é só isso! Lembram-se das campanhas surdas? Lembram-se das calúnias? Das fofocas? Dos boatos? Das pressões? Dos compromissos assumidos e desassumidos? “Se não pode ser do meu jeito, então eu deixo a equipe!”
Tem mais! Sabem das “mulherinhas carregadas de pecados, atormentadas por toda espécie de paixões” (Tm 3,6), que ficam rondando o presbitério até lançar as unhas sobre o padre, usurpando para si aquele que é consagrado ao Senhor? Mulheres sujeitas a Satã cujo único “ministério” é desviar os sacerdotes de sua missão! Tem mais, infelizmente!
Casos que dizem fazer parte de movimentos que hão de salvar a família, mas não acabam de fazer festas e comer em um só banquete o que o pobre come em um mês. Esses casais convidam o padre para sua mesa e o induzem a beber além da conta, até a embriaguez. Depois, zombam do padre e falam dele pelas costas...
É por isso que os bispos estão espantados: com que rapidez seus sacerdotes são moídos física, psíquica e moralmente pela comunidade devoradora! E choram os bispos, eu sei. Porque seus filhos se perdem...
Em tempo: Preciso pedir perdão a um grupo. Não foram os tupiniquins, mas os caetés, que devoraram o bispo Sardinha. Feita a retificação.
Carlos Scheid.

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