Uma coruja encontrou uma codorniz que lhe perguntou: - Aonde vai? Vejo que está de mala e cuia.
- Estou viajando para o oriente – respondeu a coruja.
- E por quê? Se pode saber? A senhora não está se dando bem por aqui?
- O povo da vila odeia o meu grito agudo. Por isso resolvi ir embora.
Então a codorniz observou: - O que você deveria fazer era mudar o seu grito agudo. Se não consegue- fazê-lo será indesejada em qualquer lugar.
Pertinente a observação da codorniz. Poderá a coruja mudar o seu grito estridente? Provavelmente nunca, porque o grito dela faz parte da sua natureza. Mas nós, seres humanos, podemos nos indagar sobre o que está ao nosso alcance mudar e o que carregaremos a vida inteira como parte de nós mesmos. Talvez seja essa a pergunta fundamental que nos fazemos todas as vezes que ouvimos a Palavra de Deus nos falar de “conversão”. Assim gritava João Batista no deserto convidando os contemporâneos dele a mudar de vida, a preparar-se, porque o Reino dos céus estava próximo. A pregação dele era uma advertência e um convite à mudança. Nós também somos convidados sempre a nos convertermos, a melhorar a nossa vida.
Não estou falando evidentemente de cirurgias plásticas. Hoje, com o dinheiro, é possível mudar quase tudo do nosso corpo. Ao menos o que se vê por fora. Não existe, porém, cirurgia para mudar os sentimentos, as idéias, as emoções e as convicções de uma pessoa. Somente cada um de nós pode mudar algo da própria vida, mas é necessário que a pessoa queira e assim decida. Já entendemos; existem mudanças que os outros podem fazer em nós, no entanto as mais profundas, as que poderíamos chamar de espirituais, as que norteiam o nosso agir, lutar e amar, as que dão mais sentido e mais gosto a nossa vida, dependem exclusivamente de nós. Ninguém pode nos substituir, a não ser que abramos mão da nossa consciência e da nossa liberdade.
Para mudar algo da nossa vida precisamos ter uma motivação. Em geral queremos mudar quando estamos insatisfeitos ou, ao menos, achamos que tenha algo de errado em nós. Nesse caso, podemos mudar por ambição, por interesse ou por cálculo. Isso acontece muito nos nossos relacionamentos. Infelizmente, nesta sociedade tão competitiva, a vida está se tornando um jogo de esperteza, onde as palavras e as atitudes são condicionadas pela opinião dos outros, mais ainda pela impressão que oferecemos aos chefes, aos poderosos de turno, àqueles cuja intimidade nos gratifica. Nesse caso é muito difícil distinguir a sinceridade do oportunismo. Se a motivação é interesseira, mudaremos continuamente, mas só as aparências, conduzidos pelos ventos do momento. Melhor desconfiar dessas conversões.
O segundo passo da mudança é esclarecer a nós mesmos o que queremos mudar. É nesta busca que entram em cena os modelos de vida que temos na cabeça e no coração e as pessoas que nos convidam à mudança. Por exemplo, um conselho dado na hora certa, pela pessoa certa e na maneira certa, pode mudar o rumo da vida de outra pessoa. No entanto o contrário também é verdadeiro. Alguém pode nos iludir e nos conduzir por caminhos dos quais, mais à frente, teremos que nos arrepender. Todos os dias, temos bons e maus exemplos. Precisamos discernir, saber até onde nós podemos ir, para construir o nosso caráter, a nossa personalidade. Em todos os casos a verdadeira conversão exige empenho, vontade e metas claras. De outra maneira, desistiremos de mudar, cansaremos de lutar para mudar, perderemos de vista as razões que justificam a nossa conversão.
Neste tempo de Advento, antes do Natal, podemos nos questionar sobre o que estamos aguardando de verdade na nossa vida. Se for apenas mais dinheiro ou uma mais ambiciosa posição social, a nossa conversão será para aproveitar mais das oportunidades da vida. No entanto se queremos algo mais profundo como a unidade da nossa família, relacionamentos mais amigáveis e sinceros, a nossa conversão exigirá mais humanidade, afabilidade e compreensão. Se, enfim, queremos encontrar a Deus com mais confiança e alegria a nossa conversão nos levará a refletir mais e de dar mais atenção à sua Palavra; a saber reconhecê-lo nos gestos simples e fraternos. Teremos que aprender a olhar a vida e as pessoas com o olhar de Deus. Aprender a amar sempre, a perdoar pelo bem não feito e pelo mal recebido. Como Jesus nos deu o exemplo.
Fonte: Dom Pedro José Conti
Bispo de Macapá - AP
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