No Ano Jubilar da Misericórdia, a Igreja, tendo à frente o Papa Francisco, como aquele que suscita a unidade, põe em relevo as Obras de Misericórdia. São quatorze formas para praticar a caridade, fundamentadas na palavra do Senhor (Cf. Mt 25, 31-46), assim resumidas: “Em verdade, vos digo: todas as vezes que fizestes isso a um destes mais pequenos, que são meus irmãos, foi a mim que o fizestes!” Buscamos a misericórdia de Deus, seu perdão ilimitado, acreditamos no amor que manifesta através de sua Igreja, mormente nos Sacramentos, e somos convidados a expressar em gestos muito concretos a atitude de serviço ao próximo, sem meias medidas e sem desculpas.
São as obras de misericórdia espiritual: corrigir os que erram; consolar os aflitos; perdoar as injúrias; dar bom conselhos; ensinar os que precisam sofrer com paciência as fraquezas do próximo; rogar a Deus pelos vivos e defuntos. Obras de misericórdia corporal são as seguintes: dar de comer a quem tem fome; dar de beber a quem tem sede; vestir os nus; dar pousada aos peregrinos; assistir aos enfermos; visitar os presos; sepultar os mortos. Uma das grandes alegrias que podem consolar os cristãos é que, no correr dos séculos, todas elas se traduziram em gestos e instituições que responderam às necessidades de cada época. Podemos pensar, a modo de exemplo, no crescimento das cidades e a industrialização que explodia, no século dezenove, e a quantidade de carismas surgidos para a educação de crianças e jovens. Desde muitos séculos a Igreja se faz presente nos hospitais e diversos serviços de saúde. Os males de cada século sempre encontraram cristãos que se deixaram conduzir pelo Espírito Santo e responderam com a caridade vivida.
Em nossos dias, o crescimento tantas vezes desordenado das metrópoles suscitou a presença de pessoas e grupos consagrados a Deus, que se entregaram ao trabalho de conscientização e formação de lideranças, unidade entre as pessoas, verdadeira promoção humana. Enfermidades como a AIDS encontraram centros de acolhida e tratamento. E que dizer do imenso benefício social e religioso significado pela Pastoral da Criança ou pela Pastoral da Pessoa Idosa. Multiplicam-se, em diversas modalidades, as Comunidades Terapêuticas que oferecem acompanhamento aos que estão mergulhados nas drogas. Em nossos dias, várias partes do mundo assistem as levas de migrantes, forçados pela pobreza, perseguição ou guerras, e sempre a Igreja está presente, para reconhecer em qualquer pessoa, de todas as condições sociais, idade ou religião, o testemunho da misericórdia.
Todas estas ações refletem a prática e o ensinamento de Jesus, como os evangelhos nos revelam, assim como as iniciativas das primeiras comunidades cristãs, como a coleta promovida por São Paulo pelos mais pobres, especialmente pela comunidade de Jerusalém (Cf. 2 Cor 8,1 − 9,15), cuja situação de penúria se agravou depois dos primeiros anos do cristianismo. Olhando para o Senhor, é possível perceber que ninguém passa em vão ao seu lado. São doentes, pecadores inveterados, prostitutas, endemoninhados, viúvas. Nada lhe é estranho e ele não teme aproximar-se, tocar com suas mãos as grandes chagas existentes na sociedade de seu tempo, para que, no correr dos séculos, sejam os cristãos as suas mãos para fazerem o bem.
O Evangelho de São Lucas é rico de narrativas a respeito da misericórdia de Jesus para com os fracos, pecadores e sofredores de toda ordem. Neste final de semana, o texto proclamado na liturgia nos faz visitar, junto com Jesus, a cidadezinha de Naim (Lc 7, 11-17). A cena é quase teatral: um enterro que sai da cidade, procissão da morte, e outra caminhada, procissão da vida, com os discípulos e a multidão que segue Jesus. O defunto, jovem filho único de uma mãe viúva. Já o Antigo Testamento apresentava Deus como o protetor dos órfãos e das viúvas, e Jesus é Deus. O evangelista mostra que o Senhor tem compaixão, o que quer dizer participação intensa na dor do outro, sofrer com a outra pessoa. Nem se poderia esperar outra coisa! À mãe, uma palavra: “Não chore”. Ao defunto, mais forte o clamor: “Jovem, eu te ordeno, levanta-te”. A delicadeza de Jesus entregou à mãe o jovem vivo e falante! De fato, Deus visitou o seu povo!(Cf. Lc 7, 16).
Uma obra de misericórdia, sepultar os mortos, praticada com intensidade pelo povo antigo (Cf. Tb 1, 3 − 3,10; 12, 1-22), é realizada pelos habitantes de Naim. Até hoje, em comunidades muitos simples há pessoas delicadas e capacitadas para dar assistência às famílias enlutadas, desde aquelas que sabem “arrumar o defunto”, ou tomar providências junto às entidades responsáveis pelos funerais e os que sabem conduzir a oração no velório, até chegar aos muitos grupos que se sucedem em oração, fazendo uma série de encontros, até o sétimo dia do falecimento de uma pessoa. São dons que Espírito Santo inspira a cada dia!
E Jesus, com sua procissão da vida, vem consolar a mãe aflita, e faz mais, devolve-lhe o filho vivo. Consolar os aflitos! No mês dedicado ao Sagrado Coração de Jesus, podemos ouvir o clamor de tantas pessoas que sofrem por causa de diversos males físicos, psicológicos e espirituais. A verdadeira procissão que podemos fazer, como cristãos, é não deixar passar em vão ao nosso lado quem quer que seja. E aqui vale propor que tal atitude se concretize sem análises complicadas, preconceitos ou julgamentos. Trata-se de um verdadeiro mutirão de atenções, ternura, visitas, abraços, afago, orações, participação em entidades ou iniciativas que vão, em nome das comunidades e da sociedade, ao encontro dos que se sentem isolados. Sim, de forma especial em nossas grandes cidades, espalha-se a solidão. Não são poucos casos de pessoas residentes até em condomínios cheios de vizinhos, e que se sentem absolutamente isoladas, depressivas, gritando por socorro. Está em nossas mãos a tarefa de viver de tal modo que se possa dizer, também com o testemunho de nossa geração que “um grande profeta surgiu entre nós”, e: “Deus veio visitar o seu povo”. Esta notícia se espalhe pela redondeza inteira! (Lc 7, 16-17).
Dom Alberto Taveira Corrêa
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