A Igreja celebra neste período o Tempo do Advento, abrindo o horizonte da plenitude prometida por Deus ao seu povo, na eternidade feliz a ser desfrutada junto dele. Olha ao redor, para identificar as presenças de Jesus Salvador no dia a dia da humanidade e acolhê-lo sempre e de novo, com o olhar da fé. E faz memória da irrupção da eternidade no tempo, quando, em Belém de Judá, o Verbo Encarnado nasceu na simplicidade da gruta da Natividade, para que todos os presépios viessem a atrair as gerações, de forma a oferecer a perene novidade de Jesus Cristo. Com tais olhares, a Igreja reconhece como própria a tarefa de anunciar, semear e cuidar da planta da esperança no coração das pessoas.
Jerusalém sempre foi destino de peregrinações, perseguições, guerras e destruições. Os conflitos religiosos, ideológicos e raciais acompanham até hoje sua história sofrida e martirizada. Do nosso ponto de vista, pessoas que olham de fora, ela nos escandaliza! No entanto, Deus não retira seu olhar de misericórdia sobre a cidade santa. Os profetas traduziram tal amor de Deus em promessas consoladoras: “Tira, Jerusalém, tua roupa de luto e humilhação e veste para sempre a formosura gloriosa, daquela glória que vem de Deus. Veste o manto da justiça que vem de Deus! Põe na tua cabeça a grinalda gloriosa do Eterno. Deus vai mostrar o teu esplendor a tudo o que existe debaixo do céu. De Deus receberás, então, este nome: ‘Paz-da-Justiça’, ‘Glória-do-culto-a-Deus’. É que Deus já mandou cortar todo morro elevado, toda serra antiga, para aterrar os lugares mais fundos e aplainar o chão a fim de que Israel possa passar com segurança, sob a glória de Deus” (Baruc 5, 1-9). Se ampliarmos o olhar, vendo o mundo de nossos dias a partir da cidade que tem a vocação de ser “da paz”, será possível verificar o quanto se encontra distante o sonho plantado por Deus no coração de seu povo, em todas as latitudes! Os tempos são machucados e martirizados! A situação da Terra Santa e do Oriente Médio, em seu conjunto, é um ícone da vocação e ao mesmo tempo da frustração dos planos e sonhos de povos e nações. O anúncio da esperança é fundamental para todos os nossos “mundos”!
Diante de uma grande massa do povo de Deus, cuja planta da esperança estava esmorecida, os chamados pobres de Javé, homens e mulheres certos de que Deus cumpriria suas promessas, mantinham o verdor do olhar para o futuro. Naquele tempo, às margens do Jordão, apareceu um homem de hábitos austeros, cuja palavra atraia gente da Judeia e da Galileia. Suas palavras não eram propriamente mansas, mas extremamente exigentes: “Voz de quem clama no deserto: Preparai o caminho do Senhor, endireitai as veredas para ele. Todo vale será aterrado; toda montanha e colina serão rebaixadas; as passagens tortuosas serão endireitadas, e os caminhos esburacados, aplanados. E todos verão a salvação que vem de Deus” (Lc 3, 4-6). João Batista propôs que as veredas viessem a ser aplainadas! Abaixe-se o orgulho humano, preencham-se os vales da falta de abertura para Deus, a fé esmorecida e a esperança apagada pelas demoras da história. Um tempo novo se avizinha, e João tem certeza de que chega aquele que é o Senhor da Esperança!
Em Jerusalém ou qualquer outra paragem do mundo de hoje, como espalhar de novo a semente da esperança, quando tudo aponta para um agravamento das muitas crises anunciadas ou em curso? O mesmo João Batista, noutra ocasião, apontou para aquele que é o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo. A esperança nasce onde e quando as metas são bem definidas, os objetivos são claros, supera-se a instabilidade de instituições e pessoas, a indefinição de leis e normas na vida social. Os que têm fé começam por atualizar constantemente seu grande ideal, que é o seguimento estrito e decidido de Jesus Cristo, no caminho do discipulado, que forja os missionários, provados pelo fogo das provações, mas dispostos a serem coerentes com as escolhas feitas. Não tenham medo de sonhar com a cidade da terra como “Glória-do-culto-a-Deus”. Para a sociedade, homens e mulheres de boa vontade, sabendo-se amados por Deus, podem assumir um ideal, expresso no sonho do profeta, para renomear nossas cidades, chamando-as “Paz-da-Justiça”.
Depois, há que se transformar por dentro as atitudes das pessoas. É de São Paulo que trazemos orientações carregadas de sabedoria, adequadas para todas as épocas, mormente a nossa: “Eu peço a Deus que o vosso amor cresça ainda, e cada vez mais, em conhecimento e em toda percepção, para discernirdes o que é melhor. Assim, estareis puros e sem nenhuma culpa para o dia de Cristo, cheios do fruto da justiça que nos vem por Jesus Cristo, para a glória e louvor de Deus” (Cf. Fl 1,4-6.8-11). Para ser semeadores da esperança, cresça nosso amor a Deus e ao próximo, tarefa que não pode ser delegada em nenhuma hipótese. Quem não se lança diariamente no amor e no serviço, mas se resguarda em atitudes defensivas diante das complicações do mundo, perde a batalha a que somos todos chamados.
É ainda João Batista, apaixonado pela verdade, que aponta o teor do comportamento do cristão que deseja ser semeador de esperança num mundo repleto de contradições. Pela verdade enfrentou os poderes de seu tempo e foi absolutamente coerente com seus ideais. Inteireza de vida é joia em nossos dias, quando os altos cargos do poder emanam o mau cheiro da corrupção, ou quando as pessoas se acostumam com um escandaloso ajeitamento de seu comportamento.
No entanto, há outra dimensão a ser cultivada pelos semeadores da esperança, justamente a capacidade para ver e apontar o bem que é feito, valorizando os pequenos ou grandes gestos, a generosidade que se multiplicada, malgrado todo o egoísmo existente. Em dias de final de ano, pululam as atitudes de abertura ao próximo, a sensibilidade diante do sofrimento alheio, as visitas carregadas de sentimento e de afeto. Não desprezemos os gestos das pessoas. O bem que é feito sempre semeia a esperança e abre novos horizontes. Deus não esquece nem menos um copo d’água dado por amor. São sinais da esperança que é plantada!
Dom Alberto Taveira Correa, arcebispo metropolitano de Belém do Pará
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