terça-feira, 26 de fevereiro de 2013
Mágicas e elucubrações
Apresentamos a seguir o artigo de nosso colaborador dom Felipe Arizmendi Esquivel, bispo da diocese mexicana de San Cristóbal das Casas, sobre a situação atual da Igreja e a postura a ser adotada perante tanta “mágica e elucubração”, disseminadas em ambientes que desconhecem o modo de agir da comunidade eclesial.
Situações
Quantos comentários foram suscitados pela exemplar renúncia do papa! Alguns o admiram por esta decisão evangélica e prudente, que o confirma como homem muito inteligente, livre, sensato, sacrificado pela Igreja, fiel a Jesus Cristo. Outros o interpretam negativamente, tachando a renúncia como fuga da grande responsabilidade do papado, como sinal de não poder suportar as intrigas da cúria romana. Praticam suas mágicas elucubrando sobre as origens possíveis do próximo papa, europeia, africana ou talvez da nossa América.
Uma colunista local, desconcertada, considerou esta decisão como infidelidade a Deus e mau exemplo para os sacerdotes e para os fieis casados, como se fosse um convite a não sermos fieis até o fim nos nossos compromissos. Alguns, distantes dos fatos, opinam que Bento XVI deveria fazer o mesmo que João Paulo II, que, mesmo muito idoso e doente, manifestou que não estava disposto a descer da cruz.
Iluminação
Bento XVI não desce da cruz nem foge do trabalho. Sua decisão é a de assumir outra forma de cruz: é deixar de lado os holofotes e o primado universal para se dedicar à solidão, ao silêncio e à oração, só por amor e por respeito à Igreja. Não é covardia, mas profunda maturidade humana e cristã. Ele não se sente indispensável; com toda a humildade, diminui para que outros cresçam e percorram o mundo todo com mais saúde, pregando o evangelho como Jesus nos ordenou. E o mais importante: independentemente das pessoas, já que todos nós somos passageiros. Acredito que, de agora em diante, a maioria dos papas fará o mesmo, porque os tempos requerem um papa que esteja sempre em pleno vigor.
Que o papa renuncie ao seu ministério não é inaudito nem é coisa sem sentido. É uma possibilidade prevista nas normas da Igreja. Não é uma fuga, nem uma irresponsabilidade, muito menos uma traição a Deus e à Igreja. É um fato que já aconteceu várias vezes na história da Igreja e ela segue em frente, pois não é uma empreitada apenas humana. Cristo a fundou e colocou alguém em seu lugar: Pedro, e seus sucessores, como cabeça suprema da Igreja. Não colocou anjos, mas seres humanos, limitados e temporais. Sempre cumpriu a promessa de não abandonar a Igreja em nenhuma circunstância. Ela é a sua obra, o seu corpo, que perdura através dos tempos e das pessoas. Ele a guia, de forma invisível, mas real, por meio do Espírito Santo. Esta é a nossa fé; esta é a fé da Igreja, que nos gloriamos de professar. Quem não tem esta fé, nunca compreenderá esta realidade.
O papa não é Cristo, nem dono da Igreja. É somente seu representante, seu vigário, seu servo, com a única missão de nos levar até Jesus e continuar a sua obra de salvação. Esta realidade misteriosa não é uma apropriação arbitrária, nem uma ambição de domínio. É um serviço; somos “servos inúteis”, que tentam apenas cumprir a própria tarefa, não como dominadores, mas como simples servidores.
Bento XVI foi um grande presente para a Igreja e para o mundo. Quem ainda repete clichês negativos sobre a sua pessoa não conhece a sua bondade, simplicidade, humildade, profundidade e, ao mesmo tempo, a sua amabilidade para com quem, de algum modo, manteve contato com ele. Em suas palavras há uma grande espiritualidade bíblica, teológica, antropológica, litúrgica e até pedagógica. A iluminação que ele nos ofereceu é muito atual, e nem todos a entendem, nem todos a valorizam. Alguns, ignorantes do que seja a nossa fé, esperariam que o papa e a Igreja se modernizassem, entendendo por isso um moldar-se aos critérios deste mundo. Que nem esperem! Essa é uma tentação que devemos rejeitar sempre, quem quer que venha a ser o papa eleito. Nossos critérios se arraigam no evangelho, não em concessões aos gostos deste mundo hedonista, relativista, consumista. Ser cristão é nadar contra a corrente e ser fiel somente a Jesus.
Compromissos
Não nos impressionemos com opiniões sem fundamento. A fé nos garante que Jesus é o Supremo Pastor e que o Espírito Santo assiste a sua Igreja. Oremos pelos cardeais eleitores e vivamos esses tempos com serenidade e esperança. A Igreja de Cristo segue adiante, no meio de nuvens negras e tormentas, com a luz da fé que nos aponta o caminho.
Fonte: Zenit.
segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013
A dor, o isolamento e a confiança em Deus
A fé, a solidão e o sofrimento foram alguns dos temas abordados pelo cardeal Gianfranco Ravasi no quarto dia de exercícios espirituais do papa Bento XVI e da cúria romana.
Nas primeiras meditações, o presidente do Conselho Pontifício para a Cultura se concentrou em particular na realidade do Deus que se revela. Ao avançarem os dias de retiro, o cardeal passou a refletir na resposta humana ao chamado de Deus, cuja grandeza também consiste em "nos deixar livres para abraçá-lo ou para nos afastarmos dele".
O Salmo que representa o crente, neste sentido, é o 131, ligado à "espiritualidade da infância", disse Ravasi. Este salmo testemunha que "a verdadeira confiança em Deus não é uma adesão cega", mas, sendo livre, é uma "adesão total".
Um bom exemplo é a experiência de Abraão, que, em nome da "pura fé total", sacrifica o filho Isaac para vê-lo depois restituído como "o filho da promessa".
A fé da infância, em todo caso, significa, acima de tudo, viver os ensinamentos de Jesus, que "explicitamente nos convida a ser como as criancinhas para entrar no reino dos céus".
A natureza da criança a faz confiar espontaneamente no adulto, no pai. Dotada de visão "simbólica" e não "analítica" da realidade, a criança é capaz de intuir as verdades que se referem ao "essencial". Como reconhecia Georges Bernanos, a infância pode ser recuperada somente "através da santidade".
Exemplares, neste sentido, são as orações de dois dos grandes conversos dos últimos dois séculos. Santa Teresa Benedita da Cruz (Edith Stein) imagina que "depois de uma longa noite raiará a manhã" e o reino de Deus "amanhecerá com um parto doloroso".
Por sua vez, o beato John Henry Newman, a bordo de um navio durante uma tempestade, compôs esta oração: "Guiai-me, Luz gentil, em meio às trevas, guiai-me. Escura é a noite e distante a minha casa; guiai-me".
Na meditação seguinte, Ravasi abordou o sofrimento humano diante de Deus. A dor, salientou o biblista, não é apenas uma realidade "fisiológica", mas também "existencial, sapiencial, filosófica, psicológica e teológica". A experiência da dor é sempre "radical e fundamental".
O Salmo 38 fala da vaidade, não no sentido ascético da palavra, como no Eclesiastes, mas no sentido de vazio. O salmista fala da fragilidade do homem, comparável a um "sopro". Seus lábios gritam: "Revelai-me, Senhor, o meu fim, a medida dos meus dias, e saberei o quanto a minha vida é breve" (Sl 38). É uma experiência que reflete o desespero de Jó (cfr. Jó 10).
Provocações enormes, estas últimas, para a sociedade de hoje, com seu gosto pelo efêmero e sua tendência a "mostrar apenas o que é perfeito por fora". Há, em última análise, "uma espécie de narcose que elimina todas as grandes questões".
A televisão, por exemplo, deste ponto de vista, nos informa sobre muitas coisas, mas não sabe nos indicar o caminho, especialmente quando a se vida revela frágil e miserável, observa Ravasi.
Em Jó, porém, o mal também tem uma função catártica, purificadora. Quem sofre pode descobrir o sentido das próprias limitações; sente mais necessidade de afeto; descobre uma tensão que o empurra para a transcendência. O senso do limite ajuda a "superar a superficialidade", afirma o cardeal, como conclusão da segunda meditação.
Paralela à dimensão da dor, temos a do isolamento, retratada por Ravasi na última meditação de ontem.
Existe o isolamento da solidão, que é típico das grandes cidades de hoje, cheias de pessoas que esperam “o ressoar de um telefone que nunca toca”. Não menos frequente, no entanto, é o isolamento causado pela calúnia. "Às vezes, e infelizmente isso também acontece no interior do nosso mundo, é impressionante ver a maldade com que se quer destruir o outro".
Um caso extremo de isolamento provocado pela calúnia é o "bullying on-line", que leva muitos jovens, sentindo-se ridicularizados por razões triviais, a preferirem a morte.
O mal é quase sempre provocado pelo homem, embora muito facilmente o homem o atribua a Deus. Ravasi volta, neste momento, ao drama de Jó, que tem de aceitar de Deus toda a dor mais difícil e incompreensível.
Em Jesus Cristo, no entanto, Deus assumiu todo o fardo do sofrimento humano: o medo, a traição, o abandono, o silêncio de Deus, o sofrimento físico, a morte. "Deus, em Cristo, não nos protege de todo o sofrimento, mas nos dá a força e nos livra em todo sofrimento, ficando conosco", explicou o cardeal, resumindo o espírito das três meditações anteriores.
Fonte: Zenit.
quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013
O último encontro com um sábio humilde
No dia 14/02/2013 ocorreu o último encontro do Papa Bento XVI com o clero de Roma, tradicionalmente realizado na primeira quinta-feira da Quaresma. Esse ano foi bem especial, devido à “notícia do século”, como é chamada na Europa a renúncia do Papa ao ministério petrino. A diferença dos outros anos, o evento iniciou com uma peregrinação da Praça São Pedro até a tumba do príncipe dos Apóstolos, guiada pelo cardeal-vigário de Roma, Agostino Vallini. Ao iniciar, eu trazia na memória as recordações da Missa do dia anterior, a última celebrada pelo Papa, na qual ocorreu algo extraordinário: durante a procissão final, todos se despediram do Papa com incessáveis aplausos e lágrimas. E o Papa, repleto de uma paz transbordante, sorria e abençoava a todos docemente[i].
Durante a peregrinação, feita por mais de 1.000 padres de todo o mundo, cantava-se a ladainha dos santos, algo que me fez recordar o funeral do Beato João Paulo II, o último Conclave e o dia da minha Ordenação, quando nos prostramos diante de Deus, abandonando-nos à sua Providência, com a certeza de que não estamos só, pois os santos acompanham e intercedem pela Igreja. Ao chegar diante da tumba de Pedro, rezamos o Símbolo dos Apóstolos (Credo) em italiano. Era curioso que muitos líam o texto, por medo de se equivocar num momento tão solene; logo cantamos o Pai Nosso e Ave Regina caelorumem latim, dessa vez sem receio de errar.
Depois disso nos dirigimos à Aula Paulo VI para o esperado encontro; assistimos então à gravação da lectio divina do Papa aos seminaristas de Roma, ocorrida uma semana antes. Eram impressionantes as palavras de fé do Papa que dizia que devemos evitar tanto o falso pessimismo, o pensar que tudo vai mal e que a Igreja é uma árvore que está morrendo; quanto o falso otimismo, daqueles que vêm os Seminários, conventos e igrejas fechando e dizem que tudo vai bem. Em vez disso, os cristãos devem ser realistas e estar certos de que o futuro é nosso, é de Deus, e que a árvore da Igreja cresce sempre de novo, pois ela sempre se renova; por isso devemos servi-la com a consciência de que ela é de Deus, que a mantém e governa; os sacerdotes devem dizer simplesmente: “somos servos inúteis; fizemos o devíamos fazer” (Lc. 17, 10)[ii]. Essas palavras do Papa são uma grande lição de humildade não só para os padres e seminaristas, mas para todo cristão. De fato, essa foi a mais bela lição do “Papa-professor”, dada desde a cátedra da humildade, que se tornou uma imagem da Cruz de Cristo.
Então assistimos a maravilhosa homilia do Papa no dia anterior e por fim chegou o admirado Pontífice. Entrava no auditório com passos tranquilos e foi acolhido pelo rumor dos aplausos que não queriam terminar. O cardeal Vallini então fez um belíssimo discurso, cheio de emoção, que expressou perfeitamente os sentimentos dos que estavam presentes. Disse que estávamos ali como os anciãos de Éfeso que se despediram de São Paulo com abundantes lágrimas; e trazíamos no coração sentimentos contrastantes: tristeza e respeito, admiração e pesar, carinho e orgulho. Em tudo, porém, adorávamos a vontade de Deus e nos alegravámos por ter conosco uma vez mais o amado Papa. Disse ainda que os padres permanecerão sempre unidos ao doce e forte exemplo do Papa, que o seu Magistério é uma grande riqueza e que nos comprometíamos a rezar por ele nesses dias difíceis. Naquela hora foi impossível controlar a emoção. O cardeal pediu ao Papa então que nos orientasse uma última vez, no contexto do ano da fé, contando-nos as suas recordações e esperanças, ao participar do Concílio Vaticano II.
O Papa mais uma vez surpreendeu a todos porque mostrava a mesma serenidade do dia anterior, alegria e um extraordinário bom humor. Ele arrancou de nós boas gargalhadas[iii]. Disse que era grato pela nossa presença e oração e que mesmo agora que ele se retirava, sabia que através da oração estaria próximo de nós e que tinha a certeza de que também nós estaremos próximos a ele, embora ele passaria a estar escondido para o mundo. Essas palavras nos confortaram, mas nos fizeram sentir antecipadamente as saudades de um grande Papa.
Ele disse então que a sua idade não lhe tinha permitido preparar um verdadeiro discurso e que faria somente uma pequena chiacchierata,uma conversa informal, que na verdade durou mais de 40 minutos[iv].
E ele falou do Concílio Vaticano II, resumindo suas recordações pessoais, as principais discussões teológicas antes e durante o Concílio e os principais pontos doutrinais de cada documento publicado. Expôs as questões centrais da Liturgia, da Eclesiologia, do Ecumenismo e diálogo intereligioso, além de falar da relação da Palavra de Deus e o Magistério e da liberdade religiosa. Fez uma síntese extraordinária e surpreendeu a todos ao falar do “Concílio paralelo”, que foi o dos jornalistas que interpretavam o Concílio não a partir da fé, mas de categorias políticas. E disse que infelizmente esse foi o “Concílio” que se tornou popular naqueles anos difíceis e que o verdadeiro Concílio vem sendo aplicado aos poucos. Pergunto-me se no momento atual os que interpretam a renúncia do Papa a partir de categorias políticas não fazem o mesmo que fizeram os membros daquele falso Concílio.
O Papa nos contou algo que gerou boas risadas e que nos ajuda a entender a sua recente decisão. Disse que em 1961 o cardeal de Colônia, Frings, pediu ao professor mais jovem da Universidade (ele mesmo, professor desde 59) preparar um projeto de texto para uma conferência que seria dada em Gênova, sobre o Concílio e o pensamento moderno. O jovem Ratzinger fez o texto que agradou tanto ao cardeal, que o leu completamente na Itália. Logo depois o cardeal foi chamado pelo Papa João XXIII para uma conversa e pensou que perderia o seu título de cardeal, que usaria a “púrpura” naquele dia por última vez. Na audiência, porém, o Papa João XXII foi ao seu encontro, o abraçou com afeto e disse: “Obrigado, eminência, dissestes o que eu queria dizer, mas não tinha encontrado as palavras”.
A anedota é simpática e nos revela algo profundo, que certamente influenciou o jovem Ratzinger: a humildade do cardeal, que confiou ao mais jovem professor da Universidade (tinha 34 anos) uma importante tarefa; a humildade do Papa João XXIII de agradecer ao cardeal por ter expresso o que ele pensava, sem encontrar as justas palavras. Certamente o exemplo desses homens acompanha o Papa, assim como o do primeiro pároco de quem ele foi vigário, que certo dia levou a Comunhão a um doente e, ao retornar à casa, veio a falecer, pois também estava gravemene enfermo. Esses gestos admiráveis transmitidos ao Papa nos dão a certeza de que a Igreja é uma família, na qual o bem de uns repercute em todos.
O encontro foi um momento de muita graça, no qual o Papa transmitiu serenidade a todos e um forte testemuho de fé, de esperança e de humildade. Saímos de lá agradecidos a Deus e mais convictos de que a Igreja é de Deus, que somos apenas “servos inúteis”, pois só realizamos o bem que Deus nos permite fazer. O Papa Bento XVI, que se considera um “humilde servo na vinha do Senhor”, foi sempre para nós, padres, um exemplo de sabedoria, de vida radicada na Palavra de Deus e de humildade. Por isso estamos imensamente agradecidos a Deus por sua vida e ministério e confiantes de que Jesus Cristo, o Bom Pastor, continuará guiando a sua Igreja até a sua meta.
Pe. Anderson Alves, diocese de Petrópolis.
Fonte: Zenit.
segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013
Fé na juventude
A Igreja Católica, rumo à Jornada Mundial da Juventude, que será realizada no Rio de Janeiro em julho de 2013, promove a 50ª edição da Campanha da Fraternidade, com o tema “Juventude e Fraternidade”. Neste caminho, a Igreja consolida sua opção preferencial também pelos jovens, consciente dos desafios que tem de enfrentar para renovar sua linguagem, articular seu diálogo, inserir-se nas redes sociais e garantir espaço privilegiado aos jovens na experiência do seguimento de Jesus Cristo, sua mais importante tarefa evangelizadora.
Para a Igreja Católica, particularmente no Brasil, este é um ano da juventude. As grandes metas incluem a oferta de caminhos para que os jovens experimentem o encontro pessoal com Jesus Cristo, na condição de discípulos missionários, com uma presença mais ativa nas comunidades de fé. Assim, é possível fazer crescer os dons e talentos da juventude, ampliando sua participação na busca de uma sociedade mais solidária, lugar de vivência respeitosa e comprometida com o bem comum.
Essa aposta tão importante, no caminho deste tempo da Quaresma, está iluminada pelo horizonte comovedor e evangelicamente rico do anúncio feito pelo Papa Bento XVI, de que deixará o ministério petrino no próximo dia 28. Um acontecimento que remete a Igreja, de modo muito forte, pela envergadura espiritual e moral do Papa, ao mais genuíno da simplicidade evangélica. As inteligências são desafiadas na busca de razões que, elaboradas, ancoram uma decisão de tal porte e tão impactante. As mentes também ganham uma luminosidade incomum que exige assentamento na mais qualificada significação da condição de simples “servos da vinha do Senhor”, como o Papa Bento XVI dizia no dia de sua eleição como sucessor de Pedro, em 2005.
Ainda muito importante, é considerar o desafio posto a todos os que servem na Igreja, impulsionados a uma corajosa revisão na ocupação de cargos e lugares, no desempenho de responsabilidades e na coragem saudável de não gabar-se de nada e nem se considerar, absolutamente, mais importante ou privilegiado. Na apresentação de sua renúncia, o Papa Bento XVI diz que, no mundo de hoje, sujeito a rápidas mudanças e agitado por questões de grande relevância na vida da fé, para governar a barca de São Pedro e anunciar o Evangelho é necessário vigor, do corpo e do espírito.
Não há inteligência que substitua, estratégias que se equiparem ou ações políticas e diplomáticas que alcancem a estatura e a força transformadora que virá sempre de quem cultiva esse acenado vigor espiritual. Neste momento oportuno, a Igreja percorre o caminho rico e interpelador do tempo da Quaresma, iluminada pelo brilhante testemunho de fé e de profunda intimidade com Deus, na vida e ministério do Papa Bento XVI. É chamada a avaliar, compreender e dar uma resposta adequada ao tesouro inesgotável de sua fé. Entre os muitos capítulos que estão sendo repassados, em busca de posturas e respostas novas, está o compromisso emanado da opção preferencial pelos jovens. A efetivação desta aposta, indispensável, inadiável e sempre atual no caminho evangelizador da Igreja, é um enorme desafio. Supõe muitas e profundas mudanças.
O intocável tesouro da fé, buscado cada vez mais na sua riqueza inesgotável, para ser aprendido e vivido, desafia o caminho pedagógico e formativo da Igreja, exigindo mudanças iluminadas por uma compreensão capaz de produzir nova lucidez e intuir novas respostas. Não se trata apenas de multiplicar alguns eventos, retomar práticas ou simplesmente dar algumas indicações. Os desafios são amplos. A cultura midiática, por exemplo, requer um conhecimento mais apurado, com resultados na abordagem das muitas e novas linguagens, para garantir aos jovens a vivência de experiências interativas, diálogos e, particularmente, testemunhos.
Importante, sobretudo neste tempo de Quaresma e na vivência da Campanha da Fraternidade, é cultivar, pela simplicidade evangélica, uma espiritualidade capaz de fortalecer sempre a opção preferencial pelos jovens.
Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo metropolitano de Belo Horizonte
sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013
Quem não reza vira bicho
“Quem não reza vira bicho”. A frase, cunhada por dom Angélico Sândalo Bernardino, bispo emérito de Blumenau, retrata o âmago da realidade. Com efeito, se não nos nutrimos quotidianamente na oração, como admoesta o salmista (Salmo 1), nossa alma enlanguesce. A alma débil é porta de entrada de males e perversões.
Conheço certa pessoa que era dada à oração diária. O terço também fazia parte da rotina dela. Além disso, a oração das orações, a missa, jamais era perdida. Essa pessoa participava da missa todo domingo. De repente, por um motivo que desconheço, ela abandonou a oração. Virou um verdadeiro bicho, um monstro; parecia que incorporara outra personalidade. Entregou-se ao sexo sem responsabilidade e este foi o ponto de partida para a perpetração de outras devassidões, até a indiferença completa. Perdi o contato com o indigitado amigo. Rezo por ele toda noite.
Quando falo em oração, é claro que aludo à oração como elevação da mente a Deus (santo Tomás de Aquino). Mas, penso, ainda, na frequência aos sacramentos, sobretudo à eucaristia e à penitência, que são igualmente formas de oração, em sentido amplo. Para o cristão, abandonar a prática da oração é a pior adversidade que pode sobrevir. É a morte. Já Dostoievski, na famosa obra “Irmãos Karamásov”, colocou as seguintes palavras na boca de uma das personagens: “Se Deus não existe, tudo é permitido”. Deveras, não há barreiras para o egoísmo, para usar as pessoas, porque se deixa de enxergar no próximo a imagem de Jesus Cristo.
Rezar implica sintonia com Deus. Estar com Deus é viver no amor, porque Deus caritas est, Deus é amor, como no-lo afirma são João, corroborado pelo papa Bento XVI. O amante não é egoísta; pelo contrário, preocupa-se com os outros, máxime com os mais pobres. Parar de rezar é penetrar nas vascas do óbito do espírito. E como não subsiste dicotomia entre corpo e alma, quem não reza põe tudo a perder: sua alma, sua estrutura psicossomática.
Peçamos que santa Maria, modelo de oração, nos ajude constantemente. Que ela afaste de nós o perigo de largarmos a oração, pois, vira-se mesmo bicho. Eu diria que não rezar é deixar de ser pessoa humana autêntica. Até mesmo a mente resta turvada, vez que a inteligência só é límpida quando nos abeberamos na suma inteligência: Deus.
Uma das obrigações canônicas do pároco é estimular os fiéis a orarem em família, consoante prescreve o cânon 528, § 2.º.
Nestes dias de tantas surpresas e expectativas, com a renúncia do papa e o início da sé vacante no mês que vem, temos de intensificar nossas orações.
Edson Luiz Sampel é Doutor em Direito Canônico pela Pontifícia Universidade Lateranense, do Vaticano e membro da União dos Juristas Católicos de São Paulo (Ujucasp).
Fonte: Zenit.
quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013
Encontro nacional de jovens de vários estados do Brasil
Cerca de cem jovens, de vários estados do Brasil, se reunirão no Centro de Treinamento de Ponta Negra, em Natal, de 14 a 17 de fevereiro. Será o encontro dos responsáveis nacionais pelas pastorais e movimentos juvenis, acompanhados pela Comissão Episcopal Pastoral para a Juventude, da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil - CNBB. O encontro contará com a presença dos três bispos que compõem a Comissão: Dom Eduardo Pinheiro, bispo auxiliar de Campo Grande (MS); Dom Bernardino Marchió, bispo de Caruaru (PE); e Dom Vilson Basso, de Caxias (MA); além dos assessores da CNBB, Padre Sávio Ribeiro e Padre Antônio Ramos do Prado e do Grupo Jovens Conectados.
Durante o encontro, haverá o lançamento do novo documento da Igreja Católica, no Brasil, sobre a evangelização da juventude. Na sexta-feira, à tarde, os jovens participarão do Seminário comemorativo aos 50 anos da Campanha da Fraternidade, organizado pela Arquidiocese de Natal, no Centro de Convenções, e, à noite, da missa e da vigília, na Catedral Metropolitana.
O Encontro também é uma preparação para a Semana Missionária, que será realizada em todas as dioceses do Brasil, de 16 a 20 de julho deste ano, e da Jornada Mundial da Juventude, que acontecerá de 23 a 28 de julho, no Rio de Janeiro.
Será a primeira vez que a CNBB reunirá, em único local, coordenadores de todas as expressões juvenis da Igreja Católica.
Fonte: Zenit.
quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013
A função do Bispo de Roma
Oferecemos aos leitores parte do Código de Direito Canônico em vigor que se refere à função do Bispo de Roma.
Cân. 331 — O Bispo da Igreja de Roma, no qual permanece o múnus concedido pelo Senhor de forma singular a Pedro, o primeiro dos Apóstolos, para ser transmitido aos seus sucessores, é a cabeça do Colégio dos Bispos, Vigário de Cristo e Pastor da Igreja universal neste mundo; o qual, por consequência, em razão do cargo, goza na Igreja de poder ordinário, supremo, pleno, imediato e universal, que pode exercer sempre livremente.
Cân. 332 — § 1. O Romano Pontífice, pela eleição legítima por ele aceite juntamente com a consagração episcopal, adquire o poder pleno e supremo na Igreja. Pelo que, o eleito para o pontificado supremo se já estiver dotado com carácter episcopal, adquire o referido poder desde o momento da aceitação. Se, porém, o eleito carecer do carácter episcopal, seja imediatamente ordenado Bispo.
§ 2. Se acontecer que o Romano Pontífice renuncie ao cargo, para a validade requer-se que a renúncia seja feita livremente, e devidamente manifestada, mas não que seja aceite por alguém.
Cân. 333 — § 1. O Romano Pontífice, em razão do cargo, não só goza de poder em toda a Igreja, mas adquire também a primazia do poder ordinário sobre todas as Igrejas particulares e seus agrupamentos, com a qual ao mesmo tempo se corrobora e defende o poder próprio, ordinário e imediato, que os Bispos possuem sobre as Igrejas particulares confiadas aos seus cuidados.
§ 2. O Romano Pontífice, no desempenho do seu múnus de Pastor supremo da Igreja, está sempre unido em comunhão com os outros Bispos e mesmo com toda a Igreja; tem contudo o direito de, segundo as necessidades da Igreja, determinar o modo, quer pessoal quer colegial, de exercer este múnus.
§ 3. Contra uma sentença ou decreto do Romano Pontífice não há apelação nem recurso.
Cân. 334 — No exercício do seu cargo, o Romano Pontífice é assistido pelos Bispos, que o podem ajudar com a sua cooperação por diversas formas, entre as quais o Sínodo dos Bispos. Auxiliam-no também os Padres Cardeais, e ainda outras pessoas e várias instituições segundo as necessidades dos tempos; todas estas pessoas e instituições, em nome e por autoridade dele, desempenham a missão que lhes foi confiada, para o bem de todas as Igrejas, e em conformidade com as normas definidas no direito.
Cân. 335 — Durante a vagatura ou total impedimento da Sé romana, nada se inove no governo da Igreja universal; observem-se as leis especiais formuladas para tais circunstâncias.
Fonte: Zenit.
segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013
O homem não é o autor da própria vocação
Queridos irmãos e irmãs!
Na liturgia de hoje, o Evangelho segundo Lucas apresenta a história do chamado dos primeiros discípulos, com uma versão original em relação aos outros dois evangelhos Sinópticos, Mateus e Marcos (cf. Mt 4,18-22; Mc 1:16-20 ;). O chamado é de fato precedido pelo ensinamento de Jesus à multidão e por uma pesca milagrosa, realizada pela vontade do Senhor (Lc 5,1-6). De fato, enquanto a multidão corre à beira do lago de Genesaré para ouvir Jesus, Ele vê Simão desanimado por não ter pescado nada a noite toda. Primeiro pede-lhe para entrar em seu barco para pregar para as pessoas, pois estava a uma curta distância da margem, e então, depois da pregação, ordena-lhe que saia com seus companheiros e lance as redes (v. 5). Simão obedece, e eles pescam uma quantidade incrível de peixes. Desta forma, o evangelista mostra como os primeiros discípulos seguiram Jesus confiando Nele, fundando-se em sua Palavra, acompanhada também por sinais milagrosos. Notamos que, antes deste sinal, Simão se dirige a Jesus chamando-o de "Mestre" (v. 5), e depois, o chama de "Senhor" (v. 7). É a pedagogia do chamado de Deus, que não olha muito para a qualidade dos eleitos, mas para a sua fé, como a de Simão, que diz: "Por causa de tua palavra, lançarei as redes"(v. 5).
A imagem da pesca refere-se à missão da Igreja. Comenta a este respeito Santo Agostinho: "Duas vezes os discípulos começaram a pescar a comando do Senhor: uma vez antes da paixão e outra depois da ressurreição. Nas duas pescas está retratada toda a Igreja: a Igreja como é hoje e como será depois da ressurreição dos mortos. Agora acolhe uma multidão impossível de se contar, incluindo os bons e os maus, e depois da ressurreição incluirá apenas os bons "(Discurso 248,1). A experiência de Pedro, certamente única, também é representativa do chamado de cada apóstolo do Evangelho, que nunca deve se desencorajar no anunciar Cristo a todos os homens, até aos confins do mundo. Todavia, o texto de hoje leva a refletir sobre a vocação ao sacerdócio e à vida consagrada. Essa é obra de Deus. O homem não é o autor da própria vocação, mas dá resposta à proposta divina; e fraqueza humana não deve causar medo se Deus chama. É preciso ter confiança na sua força que age na nossa pobreza; é preciso confiar sempre mais no poder da sua misericórdia, que transforma e renova.
Queridos irmãos e irmãs, que a Palavra de Deus reaviva também em nós e nas nossas comunidades cristãs a coragem, a confiança e o entusiasmo no anunciar e no testemunhar o Evangelho. Os insucessos e as dificuldades não induzam ao desânimo: a nossa tarefa é lançar as redes com fé, o Senhor fará o resto. Confiemos na intercessão da Virgem Maria, Rainha dos Apóstolos. Ao chamado do Senhor, Ela, bem consciente da sua pequenez, respondeu com confiança total: "Eis- me aqui". Com sua ajuda materna, renovemos a nossa disponibilidade de seguir Jesus, Mestre e Senhor.
Após o Angelus
Queridos irmãos e irmãs, hoje, vários povos do Extremo Oriente celebram o Ano Novo Lunar. Paz, harmonia e gratidão ao Céu são valores universais que celebramos nesta alegre ocasião e são desejados por todos para construir a própria família, a sociedade e a nação. Faço votos de que se possam realizar para aqueles povos as aspirações de uma vida feliz e próspera. Envio uma especial saudação aos católicos daqueles países, para que neste Ano da Fé se deixem guiar pela sabedoria de Cristo.
Amanhã, memória litúrgica de Nossa Senhora de Lourdes, é o Dia Mundial do Enfermo. A celebração solene terá lugar no Santuário mariano de Altötting, na Baviera. Com a oração e o afeto estou próximo a todos os enfermos e uno-me espiritualmente a todos que se reunirão neste Santuário, particularmente a mim querido.
Fonte: Zenit.
sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013
"O poder necessário" do papa como chefe de Estado
Em 2013, o Édito de Milão completa 1.700 anos. Através dele, em 313, o imperador Constantino deu fim às perseguições contra os cristãos. A tradição liga esse evento à "doação de Constantino", com que o imperador teria presenteado ao papa São Silvestre os territórios da Igreja.
A "doação de Constantino" é uma farsa histórica demonstrada definitivamente em 1440 pelo humanista Lorenzo Valla. O poder temporal do papa, a partir do século VIII, tem outras explicações, e não depende nem de doações nem de conquistas militares.
Ao contrário do que às vezes se diz, este poder temporal ainda existe no Estado da Cidade do Vaticano, reconhecido pelo Tratado de Latrão de 11 de fevereiro de 1929, que reconhece à Santa Sé a soberania sobre uma porção territorial bem menor que a dos antigos Territórios Papais.
Naquele dia, o papa Pio XI comparou a amplitude do novo Estado com o corpo de São Francisco de Assis: "Parece-nos ver as coisas como eram em São Francisco: um volume de corpo apenas suficiente para manter unida a alma".
Sem corpo, independentemente de quão pequeno fosse, o papa não teria tido liberdade real, liberdade que ficou demonstrada nos dias da ocupação nazista de Roma: a inviolabilidade extraterritorial da Santa Sé permitiu que o papa salvasse muitos membros da futura República Italiana, graças ao estadista Pietro Nenni e, especialmente, à mediação entre as partes em conflito para que não houvesse combates em Roma. Se o papa fosse, como queria Giosuè Carducci, o "cidadão Mastai", aquela ação diplomática não teria sido possível.
O livro “O Poder Necessário”, de Andrea Lonardo, recém-publicado na Itália pela Editora Antonianum, explica a verdadeira origem histórica do poder temporal da Igreja.
Foi a mudança da capital do império para Constantinopla, comandada por Constantino em 330, que deu início ao processo. O afastamento do poder imperial, forçado a enfrentar primeiro a ameaça persa e depois a árabe, gerou uma situação em que Roma se uniu sempre mais em torno da autoridade papal.
O imperador ainda exercia poder sobre Roma, tanto que voltou a residir na cidade em 663, deportou o papa Martinho I para Constantinopla e tentou várias vezes matar o papa Gregório II (715-731). Mas o bispo de Roma foi se tornando, de fato, o árbitro dos acontecimentos romanos e o gestor dos assuntos administrativos da defesa da Urbe contra os longobardos. Quando estes conquistaram Ravenna, em 751, foi só o papa que se levantou para defender o antigo território romano-bizantino.
Serviço:
Andrea Lonardo, “O Poder Necessário - Os bispos de Roma e a dimensão temporal no Liber Pontificalis, de Sabiniano a Zacarias (604-702)”. Editora Antonianum, Roma, 2012.
O livro, em italiano, pode ser encomendado à Editora Antonianum por e-mail: edizioni@antonianum.eu.
Na Itália, pode ser encontrado em:
Roma: Librerie Apostoline, Via Merulana, 124.
Assis: Libreria Internazionale Francescana, Piazza Porciúncula, 1, Santa Maria degli Angeli (e-mail: info@libreriafrancescana.it).
Fonte: Zenit.
quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013
A cruz de Jesus é a nova "árvore da vida"
Deus, como "Pai na criação", foi o tema da catequese do papa Bento XVI na audiência geral desta manhã. O credo, disse o Santo Padre, nos recorda em primeiro lugar a Sagrada Escritura (cf. Gn 1,1). Deus é, portanto, "a origem de todas as coisas e é na beleza da criação que se revela a sua onipotência de pai que ama".
"Como pai bom e poderoso, ele toma conta do que criou com amor e lealdade que nunca falham", continuou o papa.
Conforme apontado por São Paulo (cf. Hb 11,3), tendo sido o mundo criado por Deus, é a partir do invisível que toma forma o que é visível, e, assim, a fé significa "ser capaz de reconhecer o invisível mediante as suas marcas no mundo visível".
A inteligência humana pode encontrar na bíblia, à luz da fé, “a chave de interpretação para compreender o mundo”. Os primeiros seis dias da obra da criação divina do mundo são todos finalizados pela afirmação "Deus viu que isso era bom" (Gn 1,4.10.12.18.21.25).
No sétimo dia, dedicado à criação do homem, a afirmação do autor bíblico é reforçada: "Deus viu tudo o que tinha feito, e eis que era muito bom" (Gn 1,31).
"Tudo o que Deus cria é bom e belo, cheio de sabedoria e de amor. A ação criadora de Deus traz ordem, harmonia e beleza", ressaltou o papa.
Qual é o sentido, porém, "na era da ciência e da tecnologia, de ainda falarmos da criação?", questionou Bento XVI. "A bíblia não pretende ser um manual de ciências naturais; sua intenção é ajudar a entender a verdade genuína e profunda das coisas", respondeu.
Do Gênesis, portanto, aprendemos que "o mundo não é um conjunto de forças contrastantes, mas que a sua origem e estabilidade estão no Logos, na razão eterna de Deus, que continua a sustentar o universo".
Acreditar que o agir racional de Deus está na base da criação "ilumina cada aspecto da vida e nos dá a coragem de enfrentar com confiança e esperança a aventura da vida", acrescentou o papa.
O ser humano, por sua vez, na sua pequenez e limitação, é "capaz de conhecer e amar seu Criador" (constituição pastoral Gaudium et Spes, 12). A fragilidade humana, disse o papa, convive com "a magnitude do que o eterno amor de Deus quis para nós".
O Gênesis diz que o homem foi criado por Deus do "pó da terra" (cf. Gn 2,7), que torna todos iguais, sem distinções culturais nem sociais. O homem, portanto, não é deus, nem foi criado por si mesmo, mas tem originem "da terra boa, por obra de um Criador bom".
Todo homem é criado à imagem e semelhança de Deus (cf. Gn 2,7), de quem carregamos o "sopro de vida". "Esta é a razão mais profunda da inviolabilidade da dignidade humana perante qualquer tentação de avaliar a pessoa de acordo com critérios utilitários e de poder", reforçou Bento XVI.
Do Gênesis, prosseguiu ele, emergem duas imagens significativas. A primeira é "a árvore do conhecimento do bem e do mal" (cf. Gn 2,15), ponto de referência em Deus por parte do homem, que deve "reconhecer o mundo não como propriedade a ser saqueada e explorada, mas como um dom do Criador".
E há também a imagem da serpente demoníaca (cf. Gn 2,8-15), que insinua ao homem "a desconfiança de que a aliança com Deus seja como uma corrente que o prende, que o priva da liberdade e das melhores coisas da vida". Daí a origem de todas as tentações: da pretensão de "construir o próprio mundo, de não aceitar as limitações da criatura, os limites do bem e do mal, da moralidade".
Se o homem "perverte a relação com Deus com a mentira, colocando-se no seu lugar, todas as outras relações acabam alteradas" e o outro "se torna um rival, uma ameaça", a ponto de "a inveja e o ódio pelo outro entrarem no coração do homem" e Caim chegar a matar o próprio irmão Abel (Gn 4,39).
Caindo no pecado original, o homem se rebela não apenas contra Deus, mas "contra si mesmo", originando assim "todos os pecados da história". O primeiro pecado é a destruição da "relação com Deus", que, juntamente com as relações humanas, é o ponto de partida para o homem ser ele mesmo.
O homem não pode "redimir-se sozinho". Só Deus pode restaurar as "relações corretas". Se Adão tinha a pretensão de tomar o lugar de Deus, Jesus Cristo reconstrói o "relacionamento filial perfeito com o pai", rebaixando-se, tornando-se "servo" e percorrendo "o caminho do amor, humilhando-se até a morte de cruz"; a mesmo cruz que, assim, se torna "a nova árvore da vida".
Viver de fé, concluiu Bento XVI, significa, portanto, "reconhecer a grandeza de Deus e aceitar a nossa pequenez, a nossa condição de criaturas, deixando que Nosso Senhor a preencha com o Seu amor".
(06 de Fevereiro de 2013) © Innovative Media Inc.
Fonte: Zenit.
quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013
Como falar da morte às crianças
Não sou especialista nisso (será que alguém é?), mas como mãe e pedagoga já enfrentei junto às crianças algumas perdas muito significativas (algumas verdadeiramente dramáticas e chocantes) e posso partilhar nossas experiências.
Em primeiro lugar, não acredito em minimizar as perdas: a morte é um acontecimento terrível, irreversível, definitivo, que desafia toda a nossa onipotência e desestabiliza toda a nossa “segurança” - e como tal deve ser tratada. Minimizar artificialmente a dor e a perplexidade, o mistério e o insondável do fato seria como que criticar o que a criança está sentindo (mesmo nós, os adultos, não nos sentimos confortáveis diante da morte, ainda que saibamos que ela é inevitável a algum ponto da vida), impondo à sua sensibilidade real limites artificiais, o que seria simplesmente uma negação, sem sentido nem benefício algum.
Tampouco acredito em promover-se um “drama mexicano”, que resulte na perda de controle das emoções.
O que realmente ajuda é respeitar e partilhar empaticamente a dor da perda: ficar junto, ouvir muito, falar pouco; não tentar “desviar a atenção” da criança; evitar banalidades e lugares-comuns (especialmente os falaciosos, como “foi vontade de Deus”, “ele/ela está melhor assim” e quetais); responder com honestidade às suas perguntas; permitir que ela participe do velório/enterro.
Quanto ao que dizer, considero particularmente importante salientar (oportunamente) os seguintes pontos (a ordem da argumentação seria dada pela própria criança, mediante as perguntas e considerações que faz espontaneamente):
- A morte não é o fim do ente amado (bichinho ou gente), mas sim PASSAGEM: de uma forma de vida (a que estamos acostumados), a outra (que sabemos que existe, mas não conhecemos bem). A gente não “acaba” quando morre, mas fica leve e vai para Deus.
- Para onde “foi” a pessoa/animalzinho que morreu? - Para o céu, onde vão todas as almas* boas (*esse sopro de Deus que anima o corpo, que dá movimento, cor, calor).
- Por que [o/a falecido/a] me deixou? – Tenha certeza de que ele/ela não quis deixar você. Talvez a parte mais difícil de morrer tenha sido exatamente ter que deixar você. Ninguém quer morrer, mas a gente morre quando chega a hora. Todo mundo morre um dia. E depois que morre, vai para o céu, onde é muito bom.
- Se [o/a falecido/a] está vivo noutro lugar, por que não volta para mim? Por que não fala comigo? – Porque no céu o jeito de viver é diferente, e não dá para ficar indo e voltando. Eles só podem falar com a gente que ficou no mundo “no coração”. Isso eles continuam fazendo; eles continuam amando a gente e sentindo o amor da gente. Sentem ainda mais do que quando estavam no mundo com a gente, porque não estão tão ocupados com outras coisas, como escovar os dentes, pagar contas e coisas assim.
- Se eu fosse bonzinho/a, será que [o/a falecido/a] não teria morrido? Será que ele/ela foi embora porque não gostava mais de mim? (a criança tende a entreter fantasias de onipotência e egocentrismo, fica confusa com sentimentos de raiva, frustração e até da lembrança de mal-feitos, que a machucam muito neste contexto). - Não foi culpa sua; ao contrário, você teria sido uma boa razão para [o/a falecido/a] ficar no mundo, se isso fosse uma escolha. [O/a falecido/a] não foi embora porque quis, nem Deus o/a chamou para o céu para deixá-la sozinha ou castigá-la.
- Como [o/a falecido/a] pode estar num lugar bom, estar feliz, e eu ficar aqui sozinho/a, tão triste? - [O/a falecido/a] não é egoísta, não foi embora porque quis. Só que, agora que ele/ela chegou no céu e não pode voltar mesmo, descobriu que o céu é muito, muito bom! E vai ficar lá, esperando que um dia você também vá para lá.
- Vai doer? Morrer dói? – Isso eu não sei, mas sei que ninguém reclamou ate agora, e que todo mundo está feliz no céu. Se doeu, já passou.
- Por que Deus quis que as pessoas tivessem que morrer? – Deus não quis isso. Foi a desobediência da gente que fez isso acontecer, desde há muito tempo atrás. O que Deus fez, em seu grande amor por nós, foi dar um jeito de levar a gente para o céu, pertinho dele, quando a gente morre.
- Mas Deus não é todo-poderoso? – Sim, ele é. Mas decidiu respeitar a liberdade dos homens serem até desobedientes, e ajudou que as conseqüências fossem menos terríveis do que deveriam ter sido.
- Por que Deus quis respeitar a liberdade dos homens? – Porque Deus é amor, e ninguém pode amar de verdade sem liberdade. Deus nos criou à sua imagem e semelhança, e por isso quis que a gente também fosse capaz de amar de verdade, com liberdade. Só que a gente usou a liberdade para fazer outras coisas, que não foram boas para nós.
- E os bichinhos? O que têm a ver com isso? – Quando os homens (e mulheres) estragaram o mundo perfeito que Deus tinha feito para nós, estragaram TODA a criação, incluindo a perfeição da natureza, e os animaizinhos, e as plantas, e o tempo, sujando a água, o ar... essas coisas que incomodam a gente todo dia.
- Vou encontrar [o/a falecido/a] no céu? - Vai. Mas para isso, tem que ir para o céu também; tem que ser bom/boa.
- Quando eu vou morrer? – Isso ninguém sabe. Por isso, é importante aproveitar bem a vida no mundo: sendo bom/boa, fazendo coisas boas e mostrando todo o seu amor pelas pessoas e bichinhos. O importante é viver bem no mundo, e depois viver bem no céu.
- Então, eu posso morrer agora, para não sentir mais saudades? – Não é bom, não é permitido, é muito errado querer morrer por conta própria. Cada um tem que esperar o tempo certo, que é quando acontece sem a gente planejar. Porque a gente só vai para o céu quando está pronto e isso só acontece quando chega a hora certa.
- Eu tenho que esquecer [o/a falecido/a]? – Não! Em seu coração, ele/ela sempre estará presente, e tudo o que foi bom entre vocês continuará existindo, onde vocês dois estiverem: neste mundo e no céu.
- Finalmente, é muito confortador lembrar que em Deus todos se encontram, e que a oração é um modo muito especial de “conversar” com quem partiu: tanto para pedir ajuda e conforto para nós mesmos (para matar as saudades), quanto para oferecer um empurrãozinho (se faltar) para ele/ela entrar no céu.
Com tranquilidade, simplicidade e verdade (não nos esquivando de responder “não sei” quando não soubermos), podemos ajudar a criança a lidar com a perda.
Fonte: Sílvia Morgan
segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013
Fé e caridade não são apenas questões acadêmicas
A Mensagem de Bento XVI para esta Quaresma oferece a possibilidade de refletir a relação entre duas virtudes teologias: a fé e a caridade. Afirmou o Cardeal Robert Sarah, nesta manhã, na sala de imprensa do Vaticano.
O documento papal encoraja a meditar a relação “entre crer em Deus – disse o purpurado- no Deus revelado por Jesus Cristo, e a caridade, que é fruto do Espírito Santo e nos impulsiona a um horizonte de profunda abertura a Deus e ao próximo”.
Citando a experiência humanitária de um engenheiro filipino, o cardeal Sarah destacou que a fé não é apenas fonte de inspiração dos atos de caridade, mas também algo que muda “o enfoque da vida e da cultura dos mesmos beneficiários", que, graças à caridade, são ajudados a redescobrir Deus em suas vidas.
O vínculo entre fé e caridade, disse Sarah, tem duas dimensões: em primeiro lugar, "a fé verdadeira não existe sem as obras", e em segundo, "a caridade suscita a fé, e portanto é testemunho".
Além disso, no contexto do Ano da Fé e da Páscoa que se aproxima, a Mensagem do Papa para a Quaresma recorda-nos que a verdadeira fonte da caridade é "Cristo que morreu e ressuscitou por amor”.
Por esta razão, a Quaresma é um "tempo favorável para abrir os olhos dos nossos corações para os mais necessitados, partilhando com eles o nosso". Mais ainda num contexto como o europeu e mundial, marcado pela crise econômica e pelo retorno de tristes realidades como a pobreza e a exploração no trabalho.
Fé e caridade, portanto, concluiu o cardeal, são "dois lados da mesma moeda, isto é, a nossa pertença a Cristo”.
Em seguida, se pronunciou monsenhor Gianpietro Dal Toso, secretário do Pontifício Conselho Cor Unum, segundo qual, os discursos sobre fé e caridade não são apenas "questões acadêmicas", pois afetam a prática dos organismos eclesiais e da Santa Sé, mas, sobretudo, “a visão do homem", que, por sua vez, influencia os "modelos de desenvolvimento ".
Um exemplo concreto de caridade humanitária foi apresentado por Michael Thio, Presidente Geral da Confederação Internacional da Sociedade de São Vicente de Paulo. Proveniente de Singapura, Thio foi nomeado há dois anos chefe da Confederação.
"Desde nossas humildes origens há 180 anos - disse Thio - hoje estamos presentes em 148 países, com 780 mil membros, ativos em 70 mil conferências, com 1,3 milhões de voluntários que atendem mais de 30 milhões de pessoas pobres”.
A Sociedade São Vicente de Paulo atua em vários âmbitos, desde o cuidado com os pobres (alimentação, vestuário, etc.), assistência em caso de catástrofes naturais, até o acolhimento de refugiados, através de projetos de educação, saúde e planejamento urbano. Entre os mais importantes dos últimos anos, o presidente destacou a reconstrução do pátio interno de uma creche em Fukushima, danificado pelo desastre nuclear em março de 2011.
Fundamento carismático da Sociedade de São Vicente de Paulo são as três virtudes teologais. "Ao apoiar a causa dos pobres - explicou Thio - são promovidas as ações e as virtudes cristãs e nós somos apenas humildes servos que testemunham Cristo.
Fonte: Zenit.
sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013
EUA: bispos apoiam proposta migratória do Grupo dos Oito
O arcebispo de Los Angeles, dom José H. Gômez, presidente da Comissão Episcopal de Migrações da Conferência dos Bispos dos Estados Unidos, avalia com otimismo o acordo estabelecido pelo grupo de senadores conhecido como "Grupo dos Oito", que analisa uma proposta para a reforma do sistema de imigração no país.
"Dou as boas-vindas à introdução de um marco bipartidário que serve como guia para o congresso na reforma migratória”, disse Gômez, em 28 de janeiro. “É um primeiro passo importante no processo, com uma tônica bipartidária".
A proposta publicada pelo Grupo dos Oito inclui a cidadania para os cerca de onze milhões de imigrantes ilegais presentes nos Estados Unidos e reduz os prazos para a reunificação familiar, que hoje demora anos.
"É fundamental que o acordo inclua um caminho para a cidadania, para que os indocumentados saiam das sombras e tenham a oportunidade de se tornar norte-americanos”, afirmou o arcebispo de Los Angeles. “É uma esperança para milhões".
Gômez garantiu o apoio do episcopado estadunidense para impulsionar a legislação sobre a imigração. Os bispos deverão apoiar o congresso para criar um sistema que respeite os direitos humanos e a dignidade das pessoas, sem descuidar a integridade das fronteiras. "Um sistema reformado pode proteger a dignidade humana e a pátria ao mesmo tempo".
Para mais informações (em espanhol e inglês): www.justiceforimmigrants.org
Fonte: Zenit.
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