O arcebispo de Tegucigalpa e presidente da Caritas Internationalis, Cardeal Oscar Andrés Rodriguez Maradiaga, é um dos principais colaboradores do Papa Francisco. Desde abril de 2013, coordena o Conselho de cardeais que aconselham o Papa sobre a reforma da Cúria Romana e do governo da Igreja universal.
Nesta entrevista concedida a ZENIT, realizada nesta sexta-feira, em Madrid, o cardeal hondurenho diz que depois de dois anos de trabalho do Conselho dos Cardeais "o balanço é bastante positivo".
Poucos dias antes da próxima reunião chamada C-9, garante também que o Pontífice disse: "Podem reformar-se todas as instituições, mas se as pessoas não se reformam isso não leva a lugar nenhum”.
Neste sentido, explica que "a Cúria não é um tribunal" e que não pode haver "carreirismo dentro da Igreja". Portanto, uma das chaves da reforma atual é "como fazer para que as instituições da Cúria possam servir melhor, possam servia mais agilmente”.
Sobre o IOR, o Cardeal Maradiaga disse que "foram canceladas 14 mil contas". "Quando há transparência, reduz muito a corrupção", ressalta. "O Santo Padre – reconhece – estava extremamente preocupado com os escândalos que tinham a ver com a economia".
Além disso, o atual presidente da Caritas Internationalis lamenta que "haja um mito das grandes riquezas do Vaticano”. Mas, indica com ênfase que o “orçamento de todo o Estado do Vaticano, não chega nem aos tornozelos da Arquidiocese de Colônia”.
Abaixo, oferecemos a conversa tida com o arcebispo de Tegucigalpa, ao final de um briefing informativo no Foro de Nova Economia.
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Qual é o papel da Igreja na sociedade de hoje?
- Cardeal Rodríguez Maradiaga: A Igreja, como hierarquia, tem uma missão que é evangelizar especialmente a cultura. E a Igreja, como povo de Deus, tem uma missão bela que é evangelizar com o testemunho. Acho que as duas coisas se completam. Isso não quer dizer que o laicato não tenha uma missão também de ensinamento, de reflexão, etc. Mas, basicamente, o que mais devem ter todos os batizados é um testemunho dos valores do Evangelho.
Qual é o principal desafio da Igreja no século XXI?
- Cardeal Rodríguez Maradiaga: Eu diria que não cair no individualismo da sociedade moderna, mas ao contrário. Lembrar que, como Igreja, somos povo de Deus, somos comunidade. E como nos disse o Papa São João Paulo II, a Igreja tem que ser casa de comunhão e escola de comunhão. Em um mundo onde cada um procura fechar-se nos seus próprios limites, a Igreja está chamada a ter um abridor de latas na mão para ir abrindo essas áreas.
Você é o coordenador do Conselho dos Cardeais. Qual é a sua avaliação dos encontros chamados C-9, no Vaticano?
- Cardeal Rodríguez Maradiaga: O balanço é bastante positivo. Uma das coisas mais belas é que temos o Santo Padre como um de nós em todas as nossas reuniões, e está lá como um irmão a mais. Não impõe seu pensamento. Às vezes, pede alguns esclarecimentos. Mas, no geral, escuta muito. Ele está com todos nós o tempo todo. Da Santa Eucaristia da manhã até, às vezes, na noite. Almoça conosco e toma café conosco. Podemos ter esse acesso tão fraterno e tão bonito com o Santo Padre.
Que balanço? Muitas pessoas dizem: "não fizeram nada". Aquele que não sabe, é melhor não falar. Porque não se pode falar daquilo que se desconhece. O Santo Padre estava profundamente preocupado com os escândalos que tinham a ver com a economia. Então nos disse: "O primeiro passo tem que ser a questão econômica? Então vamos! Estabeleceu, antes da nossa primeira reunião, duas comissões. Uma delas, relativa à gestão do patrimônio da Sé Apostólica e outra sobre o famoso IOR, chamado Banco do Vaticano. E essas comissões entregaram os materiais que estudamos desde a primeira reunião de outubro, na reunião de dezembro de 2013 e na reunião de fevereiro já era clara a decisão. Era necessário criar uma Secretaria de Economia, quase como um ministério de Finanças dentro da Igreja. Essa foi criada por um Motu Proprio e está funcionando. O problema da administração do patrimônio da Sé Apostólica também. Constituiu atualmente como as seções de um Banco Central em um Estado. Com todas as funções, especialmente, a econômica. Depois, o IOR também foi submetido a uma reforma grande. Não é um banco em si, é uma fundação.
Eminência, seria bom esclarecer que o IOR não é um banco...
- Cardeal Rodríguez Maradiaga: É uma fundação que o Papa Pio XII fez quando havia o perigo de que Hitler tomasse o Vaticano, e, assim se perdessem os bens das comunidades religiosas. Dessa forma veio funcionando, mas com o passar do tempo se transformou praticamente em um banco, no qual havia pessoas que não deveriam ter conta lá. Foram canceladas 14 mil contas e foi dito aos seus proprietários: ‘Olhem, levem o seu dinheiro ao Estado italiano, que é onde deve estar’. Porque, muitas vezes, estava ali para não pagar impostos. E isso é basicamente um grande erro, além de ser eticamente mal. Agora, toda esta reforma levou a uma maior transparência. Hoje em dia, diria que existe uma administração muito eficiente e a publicação de tudo. Os orçamentos estarão na internet, caso já não estejam. De tal forma que seja possível ver não somente o orçamento, mas também a execução do orçamento.
Por outro lado, há um mito das grandes riquezas do Vaticano. Não sei se vocês chegaram a ver recentemente quando a arquidiocese de Colônia publicou o seu patrimônio e orçamento. O orçamento de todo o Estado do Vaticano, não chega nem aos tornozelos da Arquidiocese de Colônia! Acho que tudo isso é uma coisa boa, porque quando existe transparência diminui muitíssimo a corrupção. E isso é uma coisa boa.
E a reforma da Cúria Romana?
- Cardeal Rodríguez Maradiaga: O próprio Papa disse que podem reformar-se todas as instituições, mas se as pessoas não se reformam, isso não leva a lugar nenhum. Por isso, é básica a reforma das pessoas. A reforma de uma mentalidade. E o Papa não deixou de estar lembrando estes critérios. Por exemplo, a Cúria não é uma corte, não existe uma corte papal. Talvez no passado existiu, quando era considerado como um governante... Mas isso não é assim. O Papa diz que a Cúria está para servir. Então, um dos critérios da reforma é como fazer para que as Instituições da Cúria possam servir melhor, possam servir com mais agilidade. Portanto, outro dos critério é que não haja carreirismo dentro da Igreja.
Acabamos de celebrar o segundo ano da eleição do Papa Francisco. Como você definiria esse tempo pontificado?
- Cardeal Rodríguez Maradiaga: Para mim é muito claro. Definiria o seu pontificado com três palavras: misericórdia, alegria e pobres.
Quais são as características que você destacaria da personalidade do Santo Padre?
- Cardeal Rodríguez Maradiaga: O Santo Padre tem um estilo de comunicação muito fraterno, muito simples, e às vezes até brincalhão. Em dezembro do ano passado, estávamos com ele perto dos seus 78 anos e nos disse: ‘Olhem, rezem por mim. Eu já tenho 78’. Mas está com uma boa saúde, tem a sua mente muito clara, e tem seu objetivo muito claro. De tal forma que pedimos ao Senhor que lhe dê a vida necessária para que leve adiante esse trabalho, que é muito importante. Muito importante para o futuro. E acima de tudo, para continuar dando esperança e alegria. Ele é portador de alegria, a tristeza não tem nada a ver com a fé cristã.
Que mensagem você gostaria de dar aos leitores de ZENIT?
- Cardeal Rodríguez Maradiaga: Em primeiro lugar, que procuremos ajudar ZENIT. Porque todos apreciamos esse conteúdo, essa proximidade, e ao mesmo tempo, a riqueza da informação que recebemos. Mas, isso não vem das nuvens. Isso também requer uma solidariedade concreta. E me entristece quando vejo que lançam a sua campanha e, às vezes, não se alcançam as metas. Eu gostaria de fazer uma petição para que todos possam ajudar.
Fonte: Zenit.
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